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A conjunção quádrupla de Julho de 2015 e o que teria pintado Van Gogh

Fig. 1 Aspecto da conjunção em 18 de julho de 2015 como simulado pelo software Stellarium. O  horário é 18:00 do tempo legal de Brasília. 
Além disso, haverá uma interessante conjunção que merece toda atenção de nossos
numerosos amigos dessa nobre ciência dos céus.... em 20 de abril.
(C. Flammarion, referência à conjunção tripla da lua, Vênus, Mercúrio 
a 20 de abril de 1890 e que foi observada por 
Vincent van Gogh na Provença. Ver referência 3)

Conjunções são eventos pontuais no céu quando dois corpos celestes, em geral bem distantes um do outro, aproximam-se de forma aparente. Conforme já divulgamos aqui, a aproximação entre Júpiter e Vênus no céu ocidental irá presentear observadores com um interessante encontro não só envolvendo esses dois planetas brilhantes mas também a lua e a estrela Regulus. O fato ocorrerá no entardecer de 18 de Julho de 2015 e basta dirigir o olhar em direção ao por do sol para observar o evento (Fig. 1).

Os detalhes das distâncias, conforme observado as 18:00 do horário de Brasília, podem ser vistos na Fig. 2.
Fig. 2 Detalhes das distâncias aparentes entre os quatro corpos celestes na conjunção de 18 de julho de 2015.
van Gogh e uma interessante conjunção tripla

Do ponto de vista científico, as conjunções não mais têm importância, pois são encontros casuais no céu provocados pelo alinhamento entre os planos das órbitas planetárias. No passado, as conjunções tiveram certa importância para a astrologia, entretanto. Nosso interesse hoje é apenas contemplativo. Trata-se de uma boa oportunidade para registrar a diferença de brilho entre diferentes objetos. Júpiter, por exemplo, terá magnitude -1,7, Vênus -4,4, a lua -7,7 e Regulus 1,35, durante esse evento.

Conjunções foram registradas no passado. Um exemplo interessante está marcado em um quadro do famoso pintor Vincent van Gogh (1853-1890) chamado "Estrada com Cipreste e Estrela", pintado em 1890 pouco antes de sua morte. A identificação do evento ocorrido no céu está bem descrito na referência (1). Especialistas dizem que esse quadro reflete a crença de van Gogh de que ele iria falecer logo (o que de fato ocorreu em julho de 1890).

Fig. 3 Identificação dos objetos de uma conjunção ocorrida em 20 de abril de 1890 como pintado por Vincent van Gogh em seu quadro "Estrada com cipreste". O que lhe serviu de inspiração no anoitecer dessa data é visto na Fig. 4.

Segundo (1), van Gogh pintou esse quadro ao observar uma conjunção no céu de 20 de abril de 1890 em Saint-Rémy-de-Provence no sul da França. Biógrafos dizem que ele deixou Saint-Rémy no dia 16 de maio em direção à Paris, depois de um ano na Provença. 

Fig.4 Aspecto do céu como visto desde Avignon (próximo a Saint-Remy), França, em 20 de abril de 1890, com teria sido observado por van Gogh ao entardecer.
Fizemos uma simulação usando o Stellarium, que pode ser vista na Fig. 4. A lua podia ser vista como um fino crescente, tendo ao seu lado Vênus e, mais abaixo, Mercúrio. Tudo se encaixa, exceto pelo fato de van Gogh ter pintado a tripla de forma invertida! A posição da lua está correta (comparando a Fig. 3 a Fig. 4), mas certamente as posições de Vênus e Mercúrio estão invertidas.

Segundo (1), ele observou de fato essa conjunção, conforme escreveu em uma carta:
J’ai encore de là-bas un cyprès avec une étoile. Un dernier essai – un ciel de nuit avec une lune sans éclat, à peine le croissant mince émergeant de l’ombre projetée opaque de la terre – une étoile à éclat exageré, si vous voulez, éclat doux de rose & vert dans le ciel outremer où courent des nuages. En bas une route bordée de hautes cannes jaunes derrière lesquelles les basses Alpines bleues, une vieille auberge à fenêtres illuminées orangées et un très-haut cyprès tout droit, tout sombre. Sur la route une voiture jaune attelée d’un cheval blanc et deux promeneurs attardés. Tres romantique si vous voulez mais aussi je crois “de la Provence.” (2)
Ou, em uma tradução livre:
Tenho também lá um cipreste com uma estrela. Uma última tentativa - um céu noturno com uma lua delgada e sem muito brilho, que quase não emergia da sombra projetada da Terra - e uma estrela de exagerado brilho, se quiser, um brilho suave de rosa e verde em um céu ultramarino, onde corriam nuvens. Abaixo, uma estrada ladeada por altas canas além das quais se podiam ver o azul dos montes Alpilles, uma antiga estalagem com janelas iluminadas em amarelo e um cipreste bem alto, muito reto e escuro. Na estrada, podia-se ver uma carruagem amarela amarrada a um cavalo branco com dois caminhantes em regresso. Tudo muito romântico se quiser, mas também bastante 'Provençal'.
O fato de haver 'caminhantes em regresso' identifica o momento como o cair da tarde (e não a manhã). Especula-se ainda, que van Gogh teria sido avisado do evento por uma leitura de Camille Flammarion no L'Astronomie (3), publicado em Paris, onde consta o anúncio da conjunção tripla (veja a frase de abertura deste post). O mais provável, porém, é que van Gogh tenha simplesmente topado com o evento  ao sair para passear no anoitecer daquela data na Provença.

O que pintaria van Gogh no evento do dia 18 de julho próximo?

Referências

(1) Olson, D. W. (2014). Vincent van Gogh and Starry Skies Over France. In Celestial Sleuth (pp. 35-66). Springer New York.
(2) Ver (1): Letter 643, as numbered by Johanna van Gogh, Letter RM23, as numbered by the Van Gogh Letters Project.
(3) Flammarion, Camille, ed. (1890) Observations Astronomiques a faire du 15 avril au 15 mai. L’Astronomie 9 , 157–158.








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