02 dezembro 2019

Alguns eventos astronômicos em 2020

D. Pedro II observando Vênus com um refrator de 240 mm provavelmente do Observatório de Juvisy de C. Flammarion. Fonte: Diário Imperial.
Em comemoração ao nascimento de D. Pedro II, eis alguns dos principais eventos astronômicos de 2020. O ano contará com uma série de eclipses penumbrais da lua, muitas conjunções planetárias e uma importante oposição do planeta Marte em outubro. O ano de 2020 será ainda de muitos cometas que não alcançarão brilho suficiente para serem bem apreciados sem que seja por meio de binóculos ou telescópios. Mas isso pode mudar se um novo e brilhante cometa for descoberto ao longo do ano.

Sem dúvida alguma, o grande evento do ano será o eclipse total do sol em 14 de dezembro, que será visto como um eclipse parcial em boa parte do Brasil. A trajetória de totalidade passará pelo Chile e Argentina, uma data memorável para o turismo astronômico na América do Sul.

Eclipse penumbral de 10 de janeiro de 2020

Como eclipse penumbral, não haverá imersão da lua na sombra da Terra. Este eclipse não será visível desde as Américas, exceto por uma pequena faixa no nordeste do Brasil, quando a lua nascerá parcialmente eclipsada. Portanto, o horário de observação para essa localidade do Brasil é logo após do pôr do sol.

Eclipse penumbral de 5 de junho de 2020

No dia 5 de junho, um outro eclipse penumbral será visível em sua maior parte no oriente. Nas Américas, ele será visível apenas numa pequena faixa no litoral, como mostrado na figura abaixo. Isso representa aproximadamente metade do território do Brasil. Como no caso do eclipse de 10 de janeiro, esse também será visível  logo após o pôr do sol, com a lua se elevando no horizonte leste já parcialmente eclipsada. O escurecimento do disco lunar neste eclipse será, entretanto, menor do que no eclipse de 10 de janeiro.

Região de visibilidade do eclipse penumbral de 5 de junho.
Eclipse penumbral de 5 de julho de 2020

Visível em toda a América, em particular do Brasil. O eclipse tem início as 3:07 TU e acaba em 5:52 TU. O máximo do eclipse - quando a lua se mostrará fracamente esmaecida pela penumbra da Terra - ocorre por volta as 4:31 TU (para o Brasil, é necessário subtrair 3 horas para se ter o horário de Brasília).

Região de visibilidade do eclipse penumbral de 5 de julho.

Eclipse penumbral de 30 de novembro de 2020


Parcialmente visível na América do Sul (quando a lua estiver se pondo a oeste e, portanto, ocorrerá próximo da alvorada), este eclipse penumbral tem seu início as 7:32 TU. Desde Brasília/DF, não haverá muito tempo de observação, pois logo a lua se põe e o dia nasce. Sem dúvida, os melhores locais para observação desse evento serão a parte ocidental do Brasil (Acre e Amazônia ocidental), justamente pelo fato de a lua se encontrar mais alta no céu quando o evento começar, permitindo maior tempo de observação.

Região de visibilidade do eclipse penumbral de 30 de novembro.
Este é o último eclipse penumbral em 2020.

Grande eclipse total do sol em 14 de dezembro

Conforme a imagem abaixo (Referência), a trajetória de totalidade do evento cruzará Chile e Argentina. Em boa parte do território do Brasil, o eclipse será parcial, com obscurescimento do sol crescente a medida que se vai para o sul.

Trajetória de totalidade do eclipse do sol em 14/12/2020. Os números ao longo das linhas azuis claras são percentuais de ocultação do disco do sol.
A região de Las Grutas/Argentina é a parte mais oriental da totalidade, para uma faixa que se extende desde Puerto Saavedra no Chile, que é a sua parte mais ocidental. Qual dessas localidades será a melhor para observação depende das chances e cobertura de nuvens para a época do ano.

Para quem ficar no Brasil, o melhor local de observação é o Estado do Rio Grande do Sul, onde o disco do sol será ocultado em até 60%. Para Brasília/DF menos de 9% do disco do sol será ocultado. Nessa localidade, o eclipse tem seu início em 13:05 (hora local) e termina às 14:44, com máximo em 14:03.

Máxima elongação oriental de Mercúrio em 10 de fevereiro

O dia 10 de fevereiro também marcará a máxima elongação à leste do sol de Mercúrio (aproximadamente 18,2 graus de distância do sol). Logo, esse planeta poderá ser visto no céu da tarde. Na efeméride, eles estarão próximos na fronteira entre as constelações de Capricórnio e Sagitário. Outras elongações ocorrerão ao longo do ano.

Oposição de Marte em outubro de 2020

O ano de 2020 trará uma boa oportunidade para observação do planeta Marte. Sua oposição ocorre em outubro (dia 20) e, ainda que não seja uma oposição de máxima aproximação, será suficiente para revelar um disco de quase 23" - o que tornará possível observar detalhes em seu disco.

Diagrama da ALPO dos principais aspectos da oposição marciana de 2020.
De acordo com o site da ALPO:
A aproximação máxima ocorrerá as 14:19 TU em 6/10/2020, com um disco planetário aparente de 22,6" a uma distância de 0,41 UA ou 62,07 milhões de quilômetros de distância. Durante a máxima aproximação em 2020, o diâmetro de Marte será 1,7" menor que na oposição de 2018, porém, ele estará 31 graus mais alto no céu, o que favorecerá observadores nos hemisférios norte e sul da Terra. Observa-se que a máxima aproximação da Terra com Marte não necessariamente coincide com o tempo de oposição, mas varia num intervalo de até duas semanas.
Para observar o planeta, como já comentado aqui, um telescópio de no mínimo 150 mm de abertura é recomendado. Grandes aberturas (~ 300 mm sob boas condições atmosférica) podem proporcionar imagens detalhadas de características da superfície do planeta. 

O problema das tempestades de areia

Como é conhecido, não está garantida uma observação absolutamente límpida dos princiapis detalhes na superfície de Marte, dada a chance de ocorrerem tempestades de areia. 

Oposições planetárias

O máximo de oposição de Júpiter e Saturno ocorrerá em julho de 2020.

Mapa Stellarium da posição de Saturno e Júpiter em 20/7/2020 quando ambos os planetas estarão aproximadamente em oposição. A data marca o melhor tempo para sua observação por telescópios.

Conjunções planetárias

Uma tabela com as conjuções de planetas em 2020 e suas datas é mostrada abaixo (UTC é o horário em Tempo Universal). Particularmente interessantes serão as conjunções entre Júpiter e Marte em março de 2020 e a rara conjunção fechada entre Júpiter e Saturno em dezembro de 2020 (ver abaixo).


Uma rara conjunção planetária


No dia 21/12 uma rara conjunção com os planetas Júpiter e Saturno acontece no céu. A distância mínima de separação desses dois planetas será de 6 minutos de arco.

Na verdade, toda a conjunção poderá ser observada ao longo de 19-21 de dezembro, porém, a máxima aproximação ocorrerá no dia 21.

Como os planetas são brilhantes, a conjunção poderá ser observada por meio de telescópio durante o dia, desde que o observador seja capaz de encontrar esses planetas no céu.

Do contrário, olhe na direção do oeste logo após o final do dia. 

Aspecto da conjunção Júpiter-Saturno em 21/12 por volta das 20:30 como visto desde Brasília/DF. Produido pelo software SkyPortal.
Cometas em 2020


Conforme o documento "Comet prospects for 2020":
A menos que algum cometa brilhante de longo período seja descoberto, o ano promete ser desapontador para entusiastas de cometas. O ano começa com um cometa  de 2018 potencialmente visível a olho nu, embora, na medida em que se aproxime da Terra, ele se torne grande e difuso. O ano fechará com outro cometa em maior aproximação, mas seu brilho é incerto. Um cometa de longo período que atinja o periélio em 2020 poderá ser visível com pequenos telescópios ou binóculos no final de 2020. Mas nada muito brilhante será visível no intervalo entre o início e o final do ano.
Alguns dos cometas visíveis nesse 'intervalo' estão listados abaixo. Outros serão anunciados ao longo  de 2020.

Cometa C/2017 T2 (PanSTARRS)

Descoberto em 2 de outubro de 2017, trata-se de um cometa que atingirá o periélio em maio de 2020. Estima-se que alcançará a mag. 8.0. A melhor época para sua observação será no início de 2020 quando ele será visto como um objeto com mag. aproximadamente igual a 10.0.

Cometa 88P/Howell

Como o nome indica, trata-se de um cometa periódico (5,5 anos), que foi descoberto em agosto de 1981. Esse cometa foi alvo de um projeto de missão espacial por um time da Universidade Johns Hopkins cujo objetivo seria estudar esse cometa usando uma sonda espacial. Sua órbita está presa entre Marte e Júpiter  como ilustrado pela figura abaixo.

Diagrama da órbita o cometa 88P/Holmes com sua posição identificada em 23 de novembro de 2019.
O máximo de brilho deste cometa ocorrerá entre setembro e outubro de 2020, quando ele atingirá no máximo mag. 9.5.

Cometa 321P/SOHO

Trata-se de um cometa periódico com órbita elíptica bastante excêntrica (excentricidadede 0,98) e período de 3,7 anos. Poderá atingir mag. 7.0 em 17 de janeiro de 2020. Por causa da excentricidade de sua órbita, o cometa rapidamente ganhará e perderá brilho em um intervalo de uma semana. Em 17/1 poderá ser visto como um objeto baixo no céu oriental pouco antes do nascer do sol.

Chuvas de meteoros


As chuvas de meteoros dependem essencialmente da posição do céu em que ocorrem (a declinação da radiante) e da influência da lua cheia. O ano de 2020 contará com alguns chuveiros que coincidem com a lua nova, favorecendo a observação desses fenômenos celestes.

Líridas

Entre 22 e 23 de abril, associadas ao cometa C/1861 G1 Thatcher, esses meteoros podem produzir rastros persistentes que duram alguns segundos. Com uma lua nova ocorrendo em 23 de abril, as Líridas podem ser idealmente observadas nas regiões mais setentrionais do Brasil.

Eta Aquáridas

Será prejudicada pela presença da lua cheia (super lua) em 7 de maio.

Delta Aquáridas

Será prejudicada pela proximidade com a lua cheia em 3 de agosto.

Oriônidas

Com máximo em 21-22 de outubro e uma média de 20 meteoros por hora, a observação desse chuveiro não será prejudicado pelo brilho excessivo da lua, que tem sua fase nova em 16 de outubro.

Leônidas

Em 2020, o chuveiro se concentrará entre 17-18 de novembro e, como a lua nova ocorre em 15 de novembro, a data será ideal para sua observação. O chuveiro se irradia desde a constelação do Leão, mas podem ser vistos em qualquer lugar do céu.

Produzidas por detritos do cometal Tempel-Tuttle, tem uma média de 15 meteoros por hora, com picos a cada 33 anos. O último deles foi em 2001, logo falta ainda algum temo para o próximo máximo.

Gemínidas

Produzida por detritos do meteoro 3200 Feton, é considerada 'a rainha dos chuveiros', pois pode produzir até 120 meteoros por hora que observadores dizem ser 'multicoloridos' (desde que observado em condições ideais, noite escura e longe da poluição luminosa das cidades).

Em 2020, o chuveiro se concentrará entre 13-14 de dezembro. Com o eclipse total do sol em 14/12, isso significa que a lua não atrapalhará a observação deste ano.

Referências

Eclipses penumbrais da lua:






14 outubro 2019

O trânsito de mercúrio em 2019

Fig. 1 Imagem obtida pelo Observatório de Dinâmica Solar (SDO/NASA) mostrando
uma composição de perfis de Mercúrio em  9 de maio de 2016.
Ainda que 2019 não tenha trazido muitos fenômenos celestes noturnos, ele terá um espetáculo relativamente raro para mostrar no céu de dia. Trata-se da passagem de Mercúrio pelo sol que ocorrerá no dia 11 de novembro de 2019 (segunda-feira). Juntamente com os eclipses de 2019, o trânsito de Mercúrio contribuirá para que este ano seja conhecido dos grandes eventos astronômicos diurnos. 

Esse post complementa o evento semelhante que ocorreu em 2016. Ver "O Trânsito de Mercúrio em 2016".

O que é?

As órbitas do planetas, embora individualmente siguam trajetórias em um plano, não estão alinhadas entre si. O plano de referência para medida das órbitas do planetas é o plano da eclíptica, ou plano da órbita da Terra.

A orientação da órbita da Terra e de Mercúrio pode ser vista na Fig. 2. Mercúrio é o planeta mais interior, o mais próximo do sol. Gira em  torno dele com um período de aproximadamente 88 dias. A órbita de Mercúrio está inclinada em relação à ecliptica em 7 graus.  Apenas ocasionalmente é que a Terra se encontra na chamada 'linhas dos nodos' ou linha de cruzamento dos planos das órbita terrestre e de Mercúrio. Como a linha dos nodos passa pelo sol, quando isso acontece, ocorre um trânsito de Mercúrio. Nessa ocasião, Mercúrio está em conjunção inferior. O mesmo fenômeno ocorre com Vênus. Entretanto, como esse planeta está mais distante do sol, os trânsitos de Vênus são mais raros do que os de Mercúrio.

Fig. 2 Representação esquemática da orientação da órbita de Mercúrio em relação à da Terra. Observe que o plano é o da eclíptica. Como a órbita de Mercúrio está inclinada com a eclíptica em 7 graus, somente há duas posições na posição da Terra em que Mercúrio se 'alinha' com a Terra. Essas posições são conhecidas como nodos (nodes). Fonte: In-the-sky.
A taxa de ocorrência de trânsitos de Mercúrio é da ordem de 13-14 por século. Quase sempre, são fenômenos que ocorrem em maio ou novembro por causa das diferenças de posição da Terra em relação à Mercúrio e a razão entre os seus períodos orbitais. 

Importância do fenômeno para a ciência

Como a determinação dos momentos exatos de entrada e saída de Mercúrio do disco do sol é importante, ela depende da dinâmica de forças que atua sobre Mercúrio e seu movimento. Assim, o rastreamento da posição de Mercúrio ao longo de vários séculos é importante para:
  • Conhecer se existem mudanças na taxa de rotação da Terra e perturbações da Lua (uma vez que a observação é feita desde a Terra);
  • Medir de forma indireta a massa de Vênus a partir de perturbações que ela induz na órbita de Mercúrio,
  • Medir eventuais variações de longo prazo no disco solar,
  • Modelar efeitos de queda de luminosidade do sol com a passagem do planeta, como subsídio para estudos de técnicas de detecção de exoplanetas (aplicar o método para outras estrelas).
Trânsito de Mercúrio e história

Como o fenômeno é periódico, ele foi registrado na história da Astronomia a partir da invenção do telescópio. O diâmetro aparente de Mercúrio varia de 4.5" a 13", tornando-o um objeto impossível de ser observado contra o disco do sol sem o uso de telescópios. Ou seja, mesmo em épocas remotas, quando o  trânsito ocorreu com o sol baixo e escurecido no horizonte, dificilmente Mercúrio pôde ser visto. 

A Wikipedia registra alguns fatos históricos que ocorreram na data de trânsitos:
  • 3 de maio de 1661: trânsito que ocorreu na data de coroação do rei Carlos II da Inglaterra,
  • 7 de novembro de 1677: observado por E. Halley desde a Ilha de S. Helena.
Os trânsitos de Mercúrio foram em particular importantes para a Física. Ao longo de vários séculos, erros se acumularam na determinação da trajetória de Mercúrio. Esse erro se deve ao movimento de precessão da órbita, conforme ilustrado na Fig. 3. 


Fig. 3 Ilustração do movimento de precessão orbital que ocorre com
Mercúrio por causa de efeitos da Relatividade Geral.
O avanço do periélio de Mercúrio sempre foi uma anomalia na Física até que A. Einstein em 1915 proveu uma explicação com base na sua recem criada Teoria da Relatividade Geral. 

Como observar 

Esse fenômeno ocorrerá durante o dia. Para observá-lo, desde que o sol não esteja encoberto, todas as recomendações necessárias para se observar em segurança o sol deverão ser tomadas. Conforme escrevemos em 2016:
Para observação do fenômeno, em particular de várias pessoas simultaneamente, o método de projeção usando um telescópio ou binóculo (Fig. 4) é recomendado. Porém, o uso de filtros com observação em ocular pode ser mais prazeroso pela impressão causada pelo disco de Mercúrio contra a fotosfera solar, por causa do efeito de constaste. O observador deverá se certificar, entretanto, que possui o filtro correto para observação e jamais deverá improvisar qualquer tipo de filtro. Filtros solares de boa qualidade em geral são caros e devem ser periodicamente verificados quanto ao seu "prazo de validade", porque elementos externos podem deteriorar sua qualidade. É importante que o leitor atente ao fato de que a maior parte da radiação do sol é invisível, de forma que mesmo que a imagem apresente-se aparentemente opaca em uma primeira impressão, um filtro incorreto poderá deixar vazar radiação em intensidade suficiente para provocar cegueira irreparável. Assim, caso tenha dúvidas quanto ao método a ser usado, não deixe de aplicar o da projeção (Fig. 4).
O método da projeção é ilustrado abaixo.

Fig. 4 Método da projeção apra observar o sol usando um telescópio.

Quando observar: aspecto do trânsito para Brasília/DF.

O geometria da posição de Mercúrio e da face da Terra favorecerá amplamente o Brasil. Praticamente, a América do Sul será o melhor lugar da Terra para ver o trânsito. Isso está mostrado na Fig. 5, que ilustra a face da Terra como vista desde o Sol ao longo do fenômeno. Como se pode ver, o final do trânsito não poderá ser visto desde a Europa e África. 

Fig. 5 Face da Terra como vista desde o sol ao longo do trânsito.
Para a cidade de Brasília/DF, o fenômeno será visto das 9:34 as 15:03 do horário local (12:34-18:03 TU).

Uma simulação da posição de Mercúrio ao longo do disco do sol conforme visto em Brasília é visto na Fig. 6. O fenômeno poderá ser observado em qualquer cidade do Brasil.

Fig. 6. Simulação do trânsito de Mercúrio em 13/11/19 como visto desde Brasília.

O próximo trânsito de Mercúrio pelo sol ocorerrá em 13 de novembro de 2032.

Referência

https://astronomiapratica.blogspot.com/2016/04/o-transito-de-mercurio-em-2016.html
https://en.wikipedia.org/wiki/Transit_of_Mercury
https://in-the-sky.org/news.php?id=20191111_11_101

15 setembro 2019

Cometas em 2019: C/2019 Q4 (Borisov)

Imaagem do cometa Borisov como obtida pelo telescópio GTC de 10,5 m nas ilhas Canárias (Espanha). 
Cometas em geral podem ser classificados de acordo com suas órbitas. Cometas que têm órbitas fechadas são periódicos. Em uma outra classe estão cometas com  trajetórias parabólicas ou mesmo hiperbólicas. Por terem um excesso de velocidade (se comparados a outros membros do sistema solar), objetos com órbitas hiperbólicas provavelmente nunca pertenceram ao sistema solar: são objetos extra solares ou interestelares, já que sua exata origem (de qual sistema estelar tiveram origem) não pode ser determinada.

No dia 30 de setembro, uma busca em campos de imagens do Observatório Astrofísico da Crimeia por Gennady Borisov detectou a presença de um objeto que se distinguia dos asteroides pela presença de uma fraca cabeleira. À medida que novas observações foram sendo obtidas, sua órbita pôde ser calculada. Tratava-se de um objeto que se movia em uma trajetória com enorme excentricidade orbital (da ordem de 3), o que indicaria sua origem interestelar. 

O objeto, na data de sua descoberta, era extremamente débil, com mag. ~18.5, o que dificultava uma análise mais detalhada de sua características físicas.  Em 14 de setembro, entretanto, uma análise espectrográfica foi conseguida no Instituto de Astrofísica de Canárias, o que revelou ser sua estrutura espectral não muito diversa dos cometas do sistema solar. Ainda assim, análises de dinâmica orbital desse cometa mostraram que seu excesso de velocidade tornam sua origem no sistema solar bastante improvável. Portanto, com certo grau de certeza confirma-se sua origem interestelar. 

Dinâmica orbital e proximidade com a Terra

Cálculos orbitais presentes (setembro de 2019) colocam o periélio desse objeto por volta de 10 de dezembro de 2019, ocasião em que as estimativas de brilho conservadoras preveem máximo de magnitude da ordem de 15.0 (o que permitiria sua observação apenas por telescópios de grande porte ou acima de 300 mm de abertura desde que localizados em regiões longe da poluição luminosa). Sua excentricidade é da ordem 3.2, com inclinação orbital da ordem de 45 graus em relação à eclíptica. Na data, não excederá em 1.9 UA de proximidade da Terra, quando então se localizará na região Hydra-Crater. Um mapa de sua movimentação pelo céu pode ser visto na figura abaixo.

Mapa da posição do cometa C/2019 Q4 fornecido por S. Yochida (aerith.net) onde a data é indicada no formato mês/dia.
A curva de magnitude estimada pode ainda sofrer ajustes e colocar o cometa ao alcançe de telescópios menores. De forma alguma, porém, ele poderá ser observado a vista desarmada. Para astrônomos amadores mais avançados, será um desafio observar esse cometa - que se coloca como um visitante de fora do sistema solar - e, quem sabe, obter o seu espectro no período de maior proximidade com a Terra.

Se novidades surgirem com esse cometa, atualizaremos esta página.

Referências

C/2019 Q4 (Borisov): The First Interstellar Comet



18 junho 2019

Sete questões sobre o eclipse lunar de julho de 2019

Lua eclipsada parcialmente. 25 de abril 2013.
1. Em qual data e horário ocorrerá o eclipse?

O eclipse terá​ ocorrerá na noite de 16 de julho de 2019. Trata-se de um eclipse parcial. O início do eclipse será por volta das 15:43 do horário local (tempo de Brasília) e ocorrerá com a lua abaixo do horizonte. Para Brasília/DF, a lua poderá ser vista já eclipsada por volta das 18:30 do tempo local. Esse também é o instante em que o eclipse estará em seu máximo.

A lua nascerá, de fato, parcialmente eclipsada para o Brasil, sendo que a fase parcial (quando a sombra  da Terra deixa o disco lunar) ocorrerá por volta das 8:00 do tempo local. O eclipse tem seu fim (fase penumbral) às 21:17 do tempo local. 

Em Brasília, o máximo de obscurescimento ocorrerá com a lua aproximadamente a 8 graus acima do horizonte.

2. Onde poderá ser observado o eclipse?

O mapa da Figura ​1​, retirado de ​[1]​, mostra as regiões onde o eclipse poderá ser observado, o que representa, portanto, todo o território do Brasil. O fenômeno não será visto, por exemplo, nos Estados Unidos

Para a região escurecida​,​ o eclipse poderá ser observado na forma parcial. Na região cinza ele será penumbral, onde será possível ver apenas um leve escurecimento da lua.

Porém, o fenômeno não se dará em todos os lugares da mesma forma ao mesmo tempo, porque a Terra é esférica​ [2]​. A região nordeste será a primeira a observar o fenômeno. Sucessivamente, a lua surgirá para as regiões mais a oeste.


Figura 1 Regiões de visibilidade do eclipse da lua de julho de 2019. A região mais escura corresponde a onde o eclipse será visto como parcial. A região cinza ele será penumbral. 
3. Quanto tempo durará o fenômeno?

​O tempo total depende da posição ​do observador. ​No Brasil, a lua estará acima do horizonte já eclipsada e o fenômeno durará quase duas horas​ aproximadamente​. ​Durará mais para observadores a leste e menos para observadores a oeste.

4. Qual o melhor meio de se observar o eclipse?

Sem dúvida, a observação visual poderá se beneficiar de um bom binóculo (do tipo 7X50 ou 10X60), porém a vista desarmada é um dos melhores meios de se observar o fenômeno.

Como a lua estará próxima do horizonte, será uma boa oportunidade para tomadas fotográficas​ incluindo objetos no horizonte​. 

Observações com telescópio também são indicadas. Nesse caso, deve-se usar baixos aumentos para apreciar o disco lunar inteiro nas diversas fases do eclipse.

5. A lua ficará vermelha?

Não. Por ser um eclipse parcial, não haverá obscurecimento total da lua, condição para que ela fique vermelha.

6. Preciso ir a um lugar escuro para ver o fenômeno?

Não. A lua é um objeto bastante brilhante, de forma que sua observação é sempre possível mesmo com a luz intensa das cidades.

7. Quando será o próximo eclipse total da lua visível no Brasil?

​O próximo eclipse será em 10 de janeiro de 2020, mas não será visível no Brasil. O próximo eclipse da lua (penumbral), será apenas em 5 de julho de 2020.

Um eclipse total da lua (com direito à lua vermelha), somente será visto completamente no Brasil em maio de 2022.

Referência e comentário

[2] Proposta de experimento para os Terraplanistas: assim que visualizar a lua eclipsada nascendo à leste, algum terraplanista no nordeste poderá ligar para um colega seu no Acre e perguntar se ele está vendo a lua. A resposta será surpreendente.

12 maio 2019

Saiba quando saturno se encontrará com a Lua em 2019

Aspecto da ocultação de saturno pela Lua em 16 de julho feito pelo Stellarium para a cidade de Brasília/DF. Na imagem, alguns dos satélites de saturno também são mostrados como referência. Titã é mais brilhante em cima.
O ano de 2019 se distinguirá por inúmeros encontros entre o planeta saturno e a Lua: nada menos de 12 ocultações estão previstas este ano com duas no mês de novembro.

Todos esses eventos poderão ser observados como meras conjunções na maior parte da Terra, entretanto, apenas em algumas regiões (conforme indicado abaixo) eles serão fenômenos de ocultação, quando ao lua oculta o planeta. Além da ocultação do planeta principal, ao se utilizar equipamentos mais potentes (p. ex., um telescópio com mais de 10 cm de diâmetro), será possível observar a ocultação progressiva de diversos satélites de saturno. Recomenda-se a observação das ocultações com grandes aumentos (mais de 150X).

Considerando a data deste post, as próximas conjunções (e ocultações) de saturno com a Lua ocorrerão em:
  • 22 de maio: visível na parte sul do Oceano Índico e Austrália. Saturno será visto junto da Lua muito próximo do horizonte leste quando a lua surgir (por volta das 21:20),
  • 19 de junho: visível na parte sul da América do Sul. Saturno muito próximo da Lua (distância de 16' de arco do limbo lunar). O fenômeno poderá ser visto no Brasil a partir do final da noite de 18/6,
  • 16 de julho: visível na América do Sul. No Brasil apenas o início da ocultação poderá ser visto.
  • 12 de agosto: visível em grande parte da Polinésia, Austrália e Nova Zelândia. No Brasil, será uma conjunção com saturno distante da Lua próxima ao horizonte oeste,
  • 8 de setembro: visível na costa ocidental da África, sul do Oceano Ìndico e Austrália. No Brasil, saturno estará razoavelmente distante da Lua e o evento será visívle logo no início da noite,
  • 5 de outubro: visível na parte sul da América do Sul. No Brasil, a ocultação será visível na parte sul do país,
  • 2 de novembro: visível no extremo sul da Austrália e parte da Antártica. Será uma ocultação com o planeta algo distante da Lua.
  • 29 de novembro: visível apenas na Antártica. Como conjunção, saturno poderá ser visto próximo da Lua e seu fino crescente (distância de 30' de arco) logo no início da noite.
Dos eventos acima, apenas dois poderão ser vistos como ocultações no Brasil: o de 16 de julho e o de 5 de outubro.  

Ocultação de 16 de julho

Conforme mostrado na Fig. 1, a trajetória da região de ocultação sobre a Terra, determina os lugares onde saturno estará oculto pela Lua. O fenômeno não poderá ser visto em sua totalidade no Brasil, mas apenas quando a lua já estiver muito baixa no horizonte, no final da madrugada. Em Brasília, por exemplo, saturno começa a se ocultar por volta das 5:25, quando a lua estará a aproximadamente 10 graus acima do horizonte ocidental.

Fig. 1 Trajetória da região de visibilidade da ocultação de saturno pela Lua em 16/7/2019 segundo a referência [1]. O fenômeno poderá ser visto em boa parte da América do Sul, inclusive o Brasil, porém não em sua totalidade.
Ocultação de 5 de outubro

Conforme mostrado na Fig. 2, a trajetória da região de ocultação sobre a Terra, determina os lugares onde saturno estará oculto pela Lua. O fenômeno não poderá ser visto em sua totalidade no Brasil, mas apenas em sua parte mais austral, inclusive São Paulo/SP e Rio de Janeiro/RJ, onde a ocultação será quase "rasante".

Fig. 2 Trajetória da região de visibilidade da ocultação de saturno pela Lua em 5/10/2019 segundo a referência [1]. O fenômeno poderá ser visto em boa parte da América do Sul, inclusive o Brasil, porém não em todo o território.
Um fato interessante dessa ocultação como visto desde o Brasil é que ela se dará durante o dia. Em S. Paulo, por exemplo, o evento tem seu início por volta das 16:46 do dia 5 de outubro com a ocultação de saturno no lado não iluminado da Lua, que estará bem alta no céu. O egresso de saturno da ocultação ocorrerá em ~17:31 pelo lado iluminado. No Rio de Janeiro, a ocultação terá menor duração e, portanto, será mais rasante. Visível no Rio de Janeiro ou ainda Cabo Frio/RJ, não haverá ocultação, por exemplo, para a cidade de Macaé/RJ que, embora próxima de Cabo Frio, está suficientemente ao norte para que a geometria não favoreça a ocultação. Para as latitudes entre as de Cabo Frio e Macaé, saturno será visto como que "tocando" a Lua. 

Para todos os lugares do Brasil, saturno poderá ser visto muito próximo da Lua (distância de 12' de arco) no início da noite.

Referência

[1] The Astronomical Almanac Online. United States Naval Observatory (USNO). http://asa.usno.navy.mil/


02 abril 2019

Tenha seu observatório solar em casa

Fig. 1 Filminho do sol feito pelo autor deste blog que mostra a evolução de uma mancha solar, em luz visível entre 21/3/19 a 23/3/19, usando o Heliviewer. Para assistir ao filme acesse  https://helioviewer.org/?movieId=X1p75
Uma interface web de uma nova janela para o sol.
Observar o sol requer inúmeros cuidados. O problema maior, sem dúvida, é o excesso de luz, que é bastante prejudicial aos tecidos da retina no olho. Por isso, equipamentos para observar o sol são bem caros. Além disso, a observação do sol é mais interessante em outras faixas do espectro solar e não apenas no visível. Um telescópio solar para observar essas faixas se parece mais com um rádio em que o observador conseque "sintonizar" um canal e ver o sol em uma determinada frequência. A grande vantagem de observar o sol é que essa é uma atividade que pode ser feita durante o dia, quando a temperatura é maior do que a noite.

Por causa disso, também, observatórios solares devem se localizar em regiões de elevada altitude, para que a atmosfera terrestre e o calor não atrapalhem as observações. Idealmente, assim, telescópios solares devem se localizar muito acima das camadas mais inferiores da atmosfera terrestre. Para todos os fins práticos, o lugar mais ideal é o espaço, longe da Terra. 

Os avanços da tecnologia espacial permitiram o lançamento de satélites especiais para observar o sol. Esse são dispositivos em órbita cujas "cargas úteis" são verdadeiros observatórios solares. Juntamos a isso um banco de imagens, onde os mais finos detalhes do sol, observados bem longe da influência da atmosfera terrrestre, são registrados de forma sistemática. Adicionamos ainda a possibilidade de baixar essas imagens por meio da internet e o que temos?

O Helioviewer

Uma ferramenta versátil, que permite amplas pesquisas e acompanhamento do sol, em segurança e de vários pontos de vista ao redor dele é o Helioviewer. Trata-se de um vasto repositório de imagens do sol atualizadas, coletados por uma série de sensores em órbita do sol - em pontos estáveis no sistema solar - e que permitem ter uma visão dinâmica do sol sem sair de casa e sem usar nenhum recurso, exceto pelo seu terminal e conexão com a internet. 

Em sua versão para desktop, ele contem um grande número de opções de busca, na forma de diferentes "canais" do espectro - a maioria invisíveis aos sentidos humanos. O mais difícil, no manejo da ferramenta, é certamente escolher os sensores. Para quem está acostumado a observar o sol na faixa do visível, basta selecionar o sensor SDO-HMI na primeira aba à esquerda. A versão default não contém fusão de imagens, de forma que o disco solar nessa faixa pode ser contemplado escolhendo essa opção como mostrado na Fig. 2. A sigla "HMI" é de "Human Machine Interface" e "SDO" é para "Solar Dynamics Observatory", o sensor espacial responsável pela imagem do disco.

Fig. 2 Tela da ferramenta Helioviwer mostrando o "canal" visível através do sensor SDO-HMI no dia 27/3/2019. As abas à esquerda permitem selecionar diversos "canais" a partir dos sensores disponíveis. 
A busca por imagens é feita em uma aba inicialmente oculta na parte centra inferior chamado "Image Timeline". Clicando-se em cada sequência, é possível selecionar o conjunto de imagns que se quer mostrar do sol para uma determinado dia. 

Coisas muito interessantes podem ser feitas pelo Helioviewer, o que torna a observação do sol algo bastante dinâmico e muito atraente, principalmente quando o sol se mostrar mais ativo. Por exemplo, a Fig. 3 mostra duas imagens de uma região ativa no dia 22/3/2019. Na parte superior é a imagem do visível (SDO/HMI). Na parte inferior selecionamos em "measurement", o tipo "magnetogram". Trata-se de um sensor capaz de medir e apresentar visualmente a intensidade dos campos magnéticos flutuando na superfície do sol. As regiões escuras são de campo magnético de uma polaridade, as claras, com polaridade inversa. Isso mostra que as manchas solares são regiões de alta intensidade de campo magnético, que resfria e torna, portanto, menos luminosa a fotosfera, que é a própria manifestação da mancha.

Fig. 3 Grupo de manchas solares próximas do limbo do sol em 22/3/19 (em cima) geradas pelo Helioviewer. Sua imagem magnética (embaixo), isto é, um magnetograma indicando a direção das linhas de campo magnético nessa região ativa. Esses campos magnéticos esfriam a superfície, gerando o aparecimento das manchas. 
Uma confirmação disso pode ser visto observando a mesma região, escolhendo o sensor SDO-AIA na medida (ou canal) 171, conforme mostrado na Fig. 4. Essa figura é a versão feita por esse canal especial que mostra tubos de plasma conectando a regiões magnéticas ativas. Como as polaridades são invertidas, o campo magnético se extende ao espaço, e rios de matéria ionizada acompanham esses campos, gerando as estruturas em arco que se extendem pelo espaço, como vistas na Fig. 4. 

Fig. 4 Grupo de manchas da Fig. 3 observado no canal 171. Os tubos de plasma que conectam regiões de campo magnético de polaridade diversa (conforme mostrado pelo magnetograma da Fig. 3), são claramente vistos.

Filmes da superfície do sol

Aspectos relevantes do sol são compreendidos ao se sequenciar imagens que permitem uma visão dinâmica de seu comportamento. Aparentemente, todos os canais ou filtros da ferramenta Helioviewer agrupam imagens em sequência gerando filmes. Para isso, usamos a ferramenta "Generate a Movie" no canto superior direito. Inicialmente, o  usuário deve clicar em "Select a view" para selecionar uma região específica e, na janela de escolha de intervalo de tempo, a data inicial e final do filme a ser criado. As saídas dos filmes podem ser feitas para o Youtube, geradas na forma de GIFs animados ou simplesmente exibidas por meio de um link. Por exemplo, a evolução do canal 171 da Fig. 4 pode ser vista para certo intervalo de tempo no link: https://helioviewer.org/?movieId=y1p75 

Um grupo de manchas pode ser visto surgindo neste filme https://helioviewer.org/?movieId=spp75, obtido no dia 31/3/19.

Fig. 5 Filme gerado para o grupo de manchas da Fig. 3, mostrando a evolução dinâmica de eventos na superfíie do sol. Esse filme pode ser acessado no link https://helioviewer.org/?movieId=y1p75 
Fenômenos diversos, mas associados entre si, podem ser observados dia após dia, permitindo uma compreensão mais profunda de eventos que ocorrem no sol ou na sua vizinhança.  Um exemplo interessante é de parte da coroa solar como visto na Fig. 6, que mostra também a fusão (merge) de duas imagens. Em vermelho está uma parte da coroa, numa imagem fornecida pelo coronógrafo SOHO (LASCO, Large Angle and Spectrometric Coronagraph) junto à uma imagem em amarelo do sensor SWAP 174. Na parte direita superior, basta selecionar "Lasco C2" para se ter essa visão do sol em 27/3/2019.

Fig. 6 Imagem de 27/3/209 de parte da coroa solar (via SOHO-LASCO) superimposta ao seu disco (SWAP 174 Proba 2)

Onde estão localizados os sensores

Os principais sensores do Helioviewer são o SDO, SOHO, Stereo-A e Stereo-B, além de outros. O sensor SDO está localizado em uma órbita geosíncrona, ou seja, em uma órbita cujo período é comensurável com o da rotação da Terra e com link direto para seu apoio de solo em Whitesands/EUA.

O sensor SOHO (Solar and Heliosferic Observatory) está posicionado em uma órbita do tipo "Halo" ao redor do sol praticamente fixo em relação a Terra - ou seja, ele se localiza ao longo da linha que liga o sol a Terra em um ponto de Lagrange. 

Stereo A e B são dois sensores localizados muito longe da Terra e em órbita do sol conforme mostra a Fig. 7. Compartilham com a Terra uma órbita comum, porém estão atrasados ou adiantados em relação à Terra, fornecendo imagens complementares de toda a superfície do sol. Também estão localizados em distintos pontos de Lagrange.

Fig. 7 Diagrama esquemático da posição dos sensores Stereo A e B que integram o Helioviwer. Image: Stereo Science Center (https://stereo-ssc.nascom.nasa.gov/where.shtml)
Outras características

Algumas ferramentas de análise de imagem estão disponíveis no canto inferior esquerdo. Elas servem para indicar ao usuário a existência de regiões ativas, buracos coronais, ejeções de massas coronais, flares (explosões fotosféricas) e inúmeros outros eventos, o que era antes feito por meio de olhos humanos treinados. É possível superimpor essas indicações de fenômenos nos filmes. Para isso, basta escolher a característica e selecionar no painel indicado.

Dúvidas podem ser sanadas no tutorial do Helioviewer, disponível no canto superior direito. Um "User Guide" está disponível no endereço:


Em conclusão

A observação do sol sempre foi uma ciência empírica por excelência. Nosso conhecimento do sol depende severamente do acúmulo de images ou registros dele, o que só pode ser feito em longo prazo. A ferramenta online Helioviewer (e seu homônimo como software standalone JHelioviewer) são ferramentas de pesquisa solar colocadas inteiramente à disposição do público e, portanto, à comunidade de astronomia amadora. A principal vantagem do Helioview, além da posição estratégica em que seu sensores se localizam, é o registro sistemático, quase que em tempo real da superfíci do sol e suas cercanias, em várias frequências. Sua versão "web" (diferentemente do JHelioviewer) parece ser mais simples de manusear. 

A observação de eventos de curto prazo no sol pode ser decisiva para se mitigar riscos associados às desgraças que uma explosão solar de grandres proporções poderia gerar na Terra. Será particularmente interressante acompanhar o sol principalmente nos períodos de maior atividade. Nesse sentido, a comunidade amadora poderá utilizar o Helioviewer em suas várias versões para complementar estudos do sol feitos com telescópios terrestres. 

Referências

Müller, D., et al. "JHelioviewer-Time-dependent 3D visualisation of solar and heliospheric data." Astronomy & Astrophysics 606 (2017): A10.

Hughitt, Vincent K., et al. "Helioviewer. org: browsing very large image archives online using JPEG 2000." AGU Fall Meeting Abstracts. 2009.

Hughitt, V. K., et al. "Helioviewer: A web 2.0 tool for visualizing heterogeneous heliophysics data." AGU Fall Meeting Abstracts. 2008.

Alguns dos vídeos podem ser assistidos via Youtube




16 março 2019

Faça o seu próprio globo "Clementine" da lua


Existem muitos modelos de 'globos da Terra' para comprar, mas e da lua? Algumas empresas fabricam globos lunares em plástico, e é possível encontrar outros vendidos no mercado pela internet. O que talvez poucos sabem é que é possível fazer o seu próprio. Para isso, é preciso improvisar um pouco.

Há um site antigo, o "vendian.org", que disponibiliza imagens renderizadas das superfícies dos planetas e da lua e que podem ser usados para fazer o seu próprio globo lunar. E, ao invés de comprar, fazer um é uma exelente atividade com as crianças. Uma outra vantagem é que, depois de fazer um da lua, é posível fazer de outros planetas, baixando as superfícies do mesmo site.

É preciso um jeito de fazer com que um mapa impresso em uma superfície plana se adapte a uma superfície curva. A figura abaxo mostra a primeira imagem (há mais duas) do "modelo de gomos" da superfície lunar disponível na referência citada, que permite fazer essa aproximação.

Fig. 1 Parte 1 do "modelo em gomos"  com 480 x 720 pixels, disponível no site vendian.org, e que foram gerados para uma rendereização da superfície lunar. Essa imagem e outras deverão ser impressas em uma folha de pape fino com dimensão apropriada para ser colocada de polo a polo na superfície do modelo.
As três sequências de gomos totalizam 12 seções. Elas podem ser acessadas diretamente no site nos links abaixo:

Parte 1 (Fig. 1)

IMPORTANTE: antes de imprimir é preciso ter a superfíce onde os gomos serão colados. É possível colar sobre uma em esfera de isopor (como as ilustradas na Fig. 2, que são vendidas em diversos tamanhos). Com o globo em mãos, é preciso conhecer seu diâmetro. Uma esfera e 100 mm de diâmetro é ideal para a impressão da superfície como mostrada na Fig. 1. 

Obs.: Não recomendo usar globos muito grandes (p. ex, de 25 cm de diâmetro), pois a imagem da Figura 1 está em baixa resolução, o que poderá afetar a qualidade da imagem impressa em maior escala.

No caso que descrevo aqui, colei cada seção diretamente sobre um globo terrestre de plástico de 11 cm de diâmetro (ver Fig. 3), que é facilmente comprado em papelarias. Já montei um em isopor, mas a superfície não é rígida, de forma que sua durabilidade é menor. Outra vantagem de se usar pequenos globos terrestres em plástico é que é possível aproveitar o suporte.

Fig. 2 Esferas de isopor que podem ser usadas
para se montar o globo lunar.
Obviamente, a imagem está descrita em pixels e deverá ser colada a uma superficie que tem uma dimensão própria. Se temos, p. ex., uma esfera de 110 mm de diâmetro (como é o caso do meu globo de plástico), foi necessário ajustar o tamanho da impressão. Isso pode ser feito inserindo a imagem em um software de edição de texto (p. ex., o MS Word). No caso, a altura da imagem em centímetros deverá ser igual a πD/2, sendo D é o diâmetro do globo. Para um globo com 11 cm de diâmetro, a altura resultante é 17,3 cm. Mas, como o papel tem certa espessura, adicionei mais 1 mm na altura e o resultado foi uma impressão com 17,4 cm de altura. Entretanto,  a diferença de até 1 mm não é muito crítica.

IMPORTANTE: No ajuste da imagem, o leitor deverá FIXAR a razão de aspecto ou proporção entre largura x altura, de forma que a imagem seja reproduzida na mesma razão da original, conforme a altura desejada. Isso é muito importante porque, caso a razão mude, quando cada seção for colada, elas ou não cobrirão totalmente a superfície ou ficarão sobrando. O trabalho terá que ser refeito!


Fig. 3 Imagem do pequeno globo terrestre de 11 cm de diâmetro que foi "sacrificado" para a montagem. Cada seção da superfície deverá ser recortada e colada exatamente na sequência em que é apresentada.
Colando as seções

O processo de colagem é razoavelmente simples (ver Fig. 4), mas o leitor deverá cuidar para encaixar cuidadosamente as seções e não deixar espaços entre as fronteiras de cada uma delas. Se a impressão for feita no tamanho correto, as seções se fecharão perfeitamente, cobrindo todo o globo.

Para realizar a colagem, foi usada cola de papel. O alinhamento deve ser feito conforme cada centro do polo, para evitar problemas de encaixe. Atenção, não inverter norte com sul em cada seção! Você também tem que prestar atenção na ordem com que cada seção ou gomo é colada, que é muito importante para garantir a fidelidade final da superfície reproduzida. Para evitar esses problemas, o que fiz foi só recortar um outro gomo e colar depois que tivesse já colado um anterior. É possível recortar todos primeiro, mas eles terão que ser numerados (no verso) para evitar embaralhamento.


Fig. 4 E a Terra se transforma na lua... Deve-se colar cada seção de forma cuidadosa para evitar desalinhamento.

O resultado final pode ser visto na primeira imagem deste post. Tal como no caso da lua de verdade, não há marcas dos acidentes nas imagens da Fig. 1. É possível, porém, ter uma boa ideia da superfície da lua, principalmente de seu lado oculto com esse pequeno modelo. 

Curiosidade: as imagens que servem de modelo para as seções foram geradas por dados missão Clementine da NASA, por isso, eu o chamo de "globo Clementine da lua".

Materiais
  • Cola de papel
  • 3 Folhas de papel
  • 1 Impressora para impressão das seções da lua
  • 1 Esfera de isopor ou de plástico (ideal com aproximadamente 10 cm de diâmetro)
  • 1 Tesoura
Referência

http://www.vendian.org/mncharity/dir3/planet_globes/