02 dezembro 2023

Alguns eventos astronômicos em 2024

"O astrônomo soberano": No dia 2/12 o Dia nacional da Astronomia é comemorado no Brasil em homenagem a D. Pedro II.

"Como dois acrobatas/ Subamos, lentíssimos

Lá onde o infinito/Nem mais nome tem/Subamos!"

(Vinícius de Morais)

O ano de 2024 será um ano de grandes eventos, principalmente para os entusiastas de cometas. Esse será o ano do cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) um espetáculo no céu previsto para setembro e outubro. Haverá um grande eclipse total do sol, porém, não observado desde o Brasil. 2024 também será um ano com muitas ocultações de estrelas e planetas pela lua que poderão ser vistos no Brasil.

No que vai abaixo, alguns eventos de meu interesse são apresentados em maiores detalhes. Para outros, faço comentários sobre sua dificuldade de observação.

Atenção: As previsões de magnitudes (mag.) para os cometas descritos abaixo são estimativas teóricas. Elas podem ser diferentes (para mais ou para menos) conforme a atividade solar e fatores desconhecidos no interior dos cometas.

Janeiro

Entre 3 e 4 de janeiro ocorre o máximo do chuveiro de meteoros Quadrântidas, cuja observação será prejudicada pela presença da lua gibosa. Esse chuveiro é resultado de poeira do cometa extinto 2003 EH1

Mercúrio está em máxima elongação ocidental no dia 12.

No dia 22 ocorre uma ocultação da estrela β Tau (Elnath) que será visível no oceano Pacífico.

No dia 27 ocorre uma conjunção entre Mercúrio e Marte que será bastante "fechada" (12' de distância ou 0.2 graus.

Fevereiro

No dia 5 ocorre uma ocultação lunar de Antares (α Sco, mag. 1,09) que não será visível no Brasil. Aqui o evento será observado como uma bela conjunção entre a lua e Antares.

Cometa C/2021 S3 no dia 14/2 próximo ao aglomerado NGC 6356 ou Mel 171. 

No dia 14 ocorre o periélio do cometa C/2021 S3 (PANSTARRS). O cometa poderá atingir mag. 6.0-7.0, tornando-se um objeto visível com um bom binóculo pouco antes do nascer do sol. Esse cometa poderá ser visto por um longo período de tempo (sempre antes do nascer do sol com magnitude entre 7 e 8) desde o final de janeiro até praticamente abril. Em 14/2 ele estará na constelação de Ofíuco próximo à estrela η Oph (Sabik).

Em 22 ocorre uma conjunção entre Vênus e Marte que se posicionaram a menos de 18' de distância (ou 0.3 graus).

Março

No dia 3 ocorre uma ocultação de Antares pela lua. Esse evento será visível desde o Brasil conforme o mapa abaixo. Em parte do território do Brasil, porém, o evento será parcial. 

Mapa da ocultação de Antares pela Lua em 3 de março. Note que em boa parte do Brasil apenas o desaparecimento será observado. 

Em 22 ocorre uma conjunção entre Vênus e Saturno que será visível pouco antes do nascer do sol.

Um eclipse penumbral da lua ocorrerá no dia 25 após as 00:00, que será visível como parcial na América do Sul. Não será um evento empolgante dado o leve esmaecimento da superfície da lua cheia. Desde Brasília/DF o evento durará 4 horas e 31 minutos.

Abril

No dia 8 ocorre o tão esperado eclipse solar total que somente será visto desde a América do Norte. É possível que o cometa 12P/Pons-Brooks seja visível no céu para observadores na região de totalidade durante o eclipse de 8 de abril.

Em 21 ocorre o periélio do cometa 12P/Pons-Brooks que apresentará um máximo de brilho estimado em mag. 4.0, em tese visível a vista desarmada. Como ele apresentou diversos bursts (explosões) recentes, será possível que esse cometa seja ainda mais brilhante? Esse cometa será visto com magnitude pouco maior que 4.0 desde meados de abril até maio ao cair da noite. Na figura abaixo, uma simulação do Stellarium mostra o cometa em seu periélio no dia 21/4 na constelação do Touro.

Cometa 12P/Pons-Brooks como visto em 21/4 as 18:45 TL. Esse cometa é do "tipo Halley", com período orbital de 71 anos. Sua próxima aproximação será no ano de 2095. 

No dia 29 ocorre uma conjunção entre Netuno (mag. 7.82) e Marte (mag. 1.15). Embora o mínimo de aproximação seja bastante fechado (algo como 2' de arco), o evento somente será visto quando ambos os planetas estiverem bem acima do horizonte oriental, quando estarão mais separados. Um bom horário de observação é por volta das 4:00. Será uma ocasião para localizar Netuno no céu que estará assinalado pela sua proximidade com o planeta vermelho.

Maio

No dia 4 ocorre ocultação de Marte pela lua que não será visível no Brasil onde o evento será uma conjunção.

De 6-7 ocorre o máximo da famosa chuva Eta Aquáridas que, este ano, não contará com perturbação da lua (próximo a nova) para atrapalhar a observação. O chuveiro é causado por detritos oriundos do famoso cometa Halley.

Observadores devem procurar um local escuro, longe das cidades para melhor observar o chuveiro que, no hemisfério norte, pode apresentar uma taxa de 30 meteoros por hora.  No hemisfério sul, um bom horário para observação é a partir das 4:30 do horário local nos dias mais propícios. A radiante (ponto de origem dos meteoros) está localizada próxima à estrela Sadalmelik ou α Aqr (mag. 2.95), porém, meteoros brilhantes poderão ser vistos bem longe (a mais de 45 graus) da radiante.

No dia 19 ocorre o periélio do cometa 46P/Wirtanen de baixo brilho.

No dia 24 ocorre ocultação da estrela Antares pela lua. Esse evento será visto em uma extensa faixa na parte norte do Brasil conforme mostrado no mapa abaixo. Para o resto do país, o evento será observado como uma conjunção.

Mapa da ocultação de Antares pela Lua em 24 de maio.

No dia 31 ocorre uma ocultação de Saturno pela lua que será visível na parte sul da América do Sul. Conforme o mapa abaixo, apenas para o extremo sul do Brasil a ocultação poderá ser vista. No resto do país, o evento será uma conjunção.

Mapa de ocultação de Saturno pela lua em 31 de maio.

Junho 

Em 4, uma interessante conjunção entre Júpiter e Mercúrio, a aproximadamente 7' um do outro (ou 0,11 grau), poderá ser vista pouco antes do nascer do sol. 

O cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) atinge mag. abaixo de 10.0, sendo visível em pequenos telescópios. O mapa abaixo ilustra a posição desse cometa para o dia 6, localizado entre as estrelas β e ν Vir na constelação da Virgem. Esse cometa poderá ser observado quase durante toda a noite.

Posição do cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) no dia 6 de junho. Com mag. estimada em 9.8, esse cometa poderá ser visto mais facilmente no início de junho com pequenos telescópios.

O cometa 13P/Olbers pode ser visto no início do mês próximo ao horizonte ocidental depois do pôr do sol. Esse cometa atinge mag. abaixo de 8.0, porém, sua observação não é favorável ao hemisfério sul por estar muito próximo do horizonte.

No dia 16 ocorre uma ocultação da estrela Spica (α Vir, mag. 0.97) pela lua, porém, apenas visível como conjunção em boa parte do globo, inclusive o Brasil.

No dia 27 ocorre uma ocultação de Satuno pela lua, visível apenas no Oceano Pacífico. No Brasil, o evento será uma conjunção.

Julho

O cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) atinge mag. 7.0, podendo ser observado com pequenos binóculos.

No dia 5 a Terra atinge o afélio, ou ponto de sua órbita onde ela está mais distante do sol. Por coincidência, uma lua nova praticamente de perigeu (no dia 6) ocorre neste dia.

No dia 6 ocorre a oposição do asteroide Ceres (ou seria "planetoide"?). Nesse dia ele poderá ser observado com pequenos telescópios a mag. 7.35 próximo à estrela Ascella (ζ Sgr, mag. 3.25) na constelação de Sagitário. Pessoas com grande acuidade visual, em regiões elevadas (acima de 2000 m) e escuras talvez possam observá-lo sem ajuda de instrumentos.

Em 14 ocorre uma ocultação de Spica pela lua, evento que será observável na América do Norte. No Brasil, será uma conjunção.

Em 15, Marte e Urano estão em uma conjunção muito próxima separados por 0.5 graus na constelação do Touro.

Uma nova ocultação de Antares pela lua ocore no dia 17 que será visível no Brasil como uma conjunção.

No dia 24, a lua oculta Saturno, evento visível apenas no oceano Índico e parte da China e Índia. No Brasil o evento será uma conjunção.

No dia 30 ocorre o máximo da chuva Delta Aquáridas austral, um chuveiro que tem uma média de 25 meteoros por hora e origem cometária desconhecida. O nome da chuva se deve a posição da radiante, próxima a Scat (δ Aqr, mag. 3.25). Este ano, a lua minguante (23%) não afetará as observações e sua posição no céu favorece o hemisfério sul. Para bem observar o evento, é necessário um local escuro após o ocaso do sol. Para Brasília/DF, a lua estará abaixo do horizonte antes das 2:12 do horário local. Em particular, a data está bem colocada no inverno do hemisfério sul, quando é possível prever poucas nuvens, embora as noites mais frias.

O mais interessante dessa noite é que ela coincide com o máximo de Alfa Capricórnidas, um chuveiro associado ao cometa 169P/NEAT. Assim, o dia 30 de julho será provavelmente a melhor noite para observações de meteoros no hemisfério sul, sendo difícil a um observador preparado deixar de ver algum.

Região de Capricórnio-Aquário onde se localizam as radiantes dos dois chuveiros previstos para o dia 30 de julho. Em 2024 a lua minguante não atrapalhará as observações. Note a presença de Saturno em Aquário no dia do evento.

Agosto

Em 1, Vênus inicia trajetória em direção a sua conjunção solar como um fino crescente com mag. -4.28, é o fim da famosa "estrela vespertina". Olhe em direação a Oeste, logo no início da noite.

Em 12-13 ocorre o máximo das Perseidas, evento que será prejudicado pela  presença da lua em fase crescente.

Uma nova ocultação de Antares pela lua ocore no dia 14 que será visível no Brasil como uma conjunção.

Marte e Júpiter se encontram na constelação do Touro no dia 14, em uma conjunção com separação de 18' de arco ou 0.3 graus. O evento será visto por volta das 4:30 no dia.

O cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) atinge mag. 6.0, podendo ser observado com pequenos binóculos e talvez a vista desarmada. No dia 20 ele poderá talvez ser visto após o por-do-sol muito baixo no horizonte ocidental com mag. pouco acima de 6.0 como mostrado na figura abaixo. Nesse sentido, embora seu brilho seja menor (mag. 7.6), ele estará melhor posicionado para observação no início de agosto.

Simulação Stellarium do cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS, mag. 6.0) no dia 20 de agosto como visto desde Brasília/DF as 18:50. 

Em 20, Vênus emerge de sua conjunção solar como um fino crescente com mag. -4.06, é o início da famosa "estrela matutina". Olhe em direção a Leste antes do nascer do sol.

Uma interessante ocultação de Saturno pela lua ocorre no dia 21 de agosto (em TU). Essa ocultação poderá ser vista em boa parte do Brasil no dia 20 conforme indicado pelo mapa abaixo. A lua estará praticamente cheia, mas no resto do país o evento será visto como uma conjunção. 

Ocultação de Saturno pela lua em 21 de agosto. Note que o evento será uma conjunção na parte sudeste-sul do Brasil e que será vista no Brasil no dia 20 de agosto.

Esse evento será visto desde Brasília/DF a partir das 22:16 do horário local no dia 20, quanto a borda da lua ocultará parte dos aneis de Saturno conforme mostrado na figura abaixo.

Aspecto do início da ocultação como visto desde Brasília/DF no dia 20 de agosto, as 22:16 do horário local. O evento será interessante, pois ocorrerão ocultaçãos sucessivas das diversas luas de Saturno.

No dia 26, a lua transita o aglomerado da Plêiades. Infelizmente, o evento não será visível no Brasil. Porém, uma "conjunção" entre as Plêiades e a lua egressa do trânsito poderá ser vista nesse dia depois do nascer da lua segundo o horário local (para Brasília/DF isso corresponde a 1:00 TL).

Setembro

No dia 5 ocorre uma ocultação de Vênus pela lua visto desde a Antártica. No Brasil, será uma conjunção.

No dia 6 ocorre uma ocultação de Spica pela Lua, evento que será visto como uma conjunção na América do Sul.

No dia 8 ocorre a oposição do planeta Saturno (mag. 0.57) na constelação de Aquário e o mês será favorável para sua observação. Seu diâmetro aparente será 19.22".

Chegamos finalmente ao mês de aproximação do grande cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS). Tomando como horário de observação as 5:30 TL da manhã, desde Brasília/DF o cometa começará a ser visto a partir do dia 13 com mag. 3.1 baixo no horizonte oriental, subindo gradualmente, até o final do mês, para entrar em outubro com mag. 0.3. Na figura abaixo, uma simulação mostra o aspecto do cometa as 5:30 desde Brasília no dia 26,  quando ele atingirá mag. 0.8. Esse será o primeiro período de observação do cometa para Brasília/DF (o segundo ocorrerá em outubro).

Aspecto do cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) como visto desde Brasília/DF as 5:00 do tempo local no dia 26 de setembro. Sua mag. estimada na data é 0.8 sendo facilmente visto à vista desarmada próximo ao horizonte oriental próximo à constelação do Sextante.

No final de 17 no Brasil ocorrerá um eclipse parcial da lua na constelação de Peixes. No Brasil, o evento será visto integralmente, com parte da sombra da Terra (umbra) sendo projetada sobre o disco da lua. Em sua maior parte o eclipse será penumbral, notando-se leve esmaecimento do disco lunar. O eclipse se inicia as 00:41 (TU), tem seu máximo as 2:12 (TU) e finaliza as 4:47 (TU) do dia 18.

Aspecto da lua eclipsada parcialmente as 00:00 (horário de Brasília) no dia 18 de setembro (horário TU).

No dia 27, o cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan-ATLAS) atinge seu periélio, ou ponto de maior aproximação com o sol na distância de 0.391 UA.

Outubro 

No dia 2 ocorre um eclipse anular do sol. O eclipse é anular pois a lua estará em seu apogeu (ponto mais afastado em sua órbita do baricentro do sistema Terra-lua). Esse evento será visível no extremo sul da América do Sul (Patagônia) e será parcial em boa parte do Brasil. No extremo sul do Brasil, a lua encobrirá o disco do sol em cerca de 20%.

Trajetória e região do eclipse anular do sol em 2 de outubro.

No dia 7 ocorre uma ocultação de Antares pela lua visível no Oceano Pacífico, evento que será uma conjunção no Brasil.

No dia 12 o cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan-ATLAS) atinge o perigeu, ou ponto mais próximo da Terra (distância de 0.556 UA). Sua observação poderá ser continuada em outubro, sendo observado como um astro vespertino com mag. acima de 1.0.

No dia 14 ocorre uma ocultação de Saturno pela lua que será observada na América do Sul como uma conjunção.

No dia 19 ocorre o trânsito da lua pelo aglomerado das Plêiades. Infelizmente, o evento não favorecerá o hemisfério sul. Uma conjunção entre a lua e esse aglomerado poderá ser vista, porém, logo após o nascer da lua. Para Brasília/DF, deve-se olhar em direção ao leste após as 21:00 do horário local.

No dia 21-22 ocorre pico do chuveiro Oriônidas associadas ao cometa Halley. Infelizmente a presença da lua gibosa poderá prejudicar a observação dos meteoros mais débeis.

No dia 31, o cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) continua a ser observado logo após o anoitecer desde o hemisfério sul como um astro de mag. 4.5. Ele estará localizado na constelação de Ofíuco como mostrado na simulação do Stellarium.

Aspecto simulado do cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) em 31 de outubro as 19:00 do TL de Brasília. Nessa noite o cometa poderá ser localizado na constelação de Ofíuco.

Novembro 

Em 3 a lua estará em conjunção com Mercúrio. Tendo passado pela fase de nova no dia 1, o fino crescente estará também próximo à Antares formando uma bela conjunção. É possível observar vários trânsitos da lua pelas estrelas de fundo da constelação do Escorpião, uma região bastante populada de estrelas. 

Em 11, a lua oculta Saturno em um evento que será visto no extremo norte do Brasil e da América do sul conforme o mapa abaixo. 

Região de ocultação de Saturno pela lua em 14 de novembro. O extremo norte do Brasil é parte da região de ocultação, que será observado como uma conjunção no resto do país.

No dia 16, a lua transita pelo aglomerado das Plêiades. O evento, entretanto, ocorre em grande parte do Brasil depois do alvorecer. Para Brasília/DF, olhe em direção a Oeste por volta das 4:30 do horário local para ver a conjunção da lua com o aglomerado.

Em 16 ocorre a oposição do planeta Urano, momento de melhor observação desse planeta. Seu diâmetro aparente será de aproximadamente 3.8" e o  planeta estará localizado na constelação de Touro.

Entre 17-18 ocorre o chuveiro das Leônidas cuja observação, este ano, será prejudicado pela proximidade com a lua cheia.

No dia 29, o cometa C/2023 A3 (Tsuchinshan- ATLAS) atinge o brilho 8.0 e ainda é observado com binóculos ao atravessar a constelação da Águia. 

Dezembro

No dia 6, Marte inicia seu movimento retrógrado. É o resultado de uma compensação de movimentos orbitais entre esse planeta e a Terra. É o início também da temporada de observação de Marte que ruma para a oposição em janeiro de 2025.

No dia 7 ocorre a oposição do planeta Júpiter, sendo o melhor momento para sua observação. Este ano, Júpiter se localiza na constelação de Touro e, na data, terá um diâmetro aparente de 47.1".

No dia 8 ocorre a última ocultação de Saturno pela lua em 2024, visível no Pacífico setentrional. O evento será observado como uma conjunção na América do Sul.

O pico das Gemínidas ocorre em 14-15. Esse chuveiro é produzido por detritos de um asteroide recentemente descoberto. Entretanto, a proximidade com a lua cheia no dia 15 prejudicará as observações este ano.

Em 15 ocorre a última ocultação de β Tau (Elnath, mag. 1.65) pela lua de 2024. O desaparecimento da estrela será visto apenas no noroeste e extremo do Brasil, pouco antes do nascer do sol conforme mostra o mapa abaixo.

Ocultação de β Tau pela lua em 15 de dezembro. O desaparecimento será observado apenas no noroeste e extremo norte do Brasil.

Em 18 ocorre ocultação de Marte pela lua, evento que será visível apenas no Ártico.

No final de dezembro, Marte poderá ser observado no céu com diâmetro aparente de 15" dando início à temporada de observação daquele planeta que antecede sua oposição logo no começo de 2025.

Siglas

TL: tempo loca (de Brasília)

TU: Tempo Universal (Greenwich)

UA: Unidade Astronômica


Referências




17 setembro 2023

Nova recorrente: T CorB terá um máximo em 2024?

Fig. 1 Um modelo para T CorB segundo a Wikipedia.

Há uma história fascinante ligada a T CorB ou "T Coronae Borealis" (AAVSO 1555+26, TIC 462607643 ou HD 143454), uma estrela de mag. 10 na constelação da Coroa Boreal. Dizem que, de temos em tempos, essa estrela apresenta um fenômeno de aumento súbito de brilho que pode levá-la a se tornar visível à vista desarmada.

A estrela em si é um sistema binário formado por duas componentes: uma gigante vermelha (chamada componente "fria" justamente por ser vermelha) e uma anã-branca que canibaliza a gigante e tem seu próprio disco de acreção (Fig. 1). O conjunto binário é chamado também "par simbiótico" por causa talvez dessa relação mais ou menos perigosa que seria melhor descrita como uma espécie de "parasitismo estelar".

A novidade é que a Associação Astronômica Britânica já lançou alguns informes para início de uma campanha de observação dessa estrela. Segundo um artigo escrito por Jeremy Shears [1]:
É necessária vigilância, e os observadores são encorajados a manter um olhar atento sobre o T CrB. São solicitadas observações noturnas visuais e digitais (CCD/CMOS) para monitorar o desvanecimento atual e identificar o mínimo do mergulho Peltier pré-erupção, que será o aviso de 3 meses da erupção. Gráficos estelares de comparação do campo estão disponíveis no site do VSS (7). No momento em que este artigo foi escrito, T CrB apresentava mag. 10, portanto, um pequeno telescópio é suficiente para observá-la. Durante a queda, é provável que seu brilho diminua brevemente para a mag. 12.
Diz a história que essa estrela foi descoberta em 1866 por J. Birmingham durante uma erupção em que atingiu a mag. 2.0 em maio daquele ano. Outra erupção ocorreu em fevereiro de 1946 (NOVA CrB 1946). Parece que o máximo ocorre aproximadamente a cada 80 anos, como consequência da intermitência do derramamento de matéria da gigante vermelha sobre o disco de acreção de sua companheira anã. O fenômeno em si (chamada "erupção") é muito rápido, ele requer observadores em monitoramento constante, pois com a mesma velocidade que o máximo chega ele se vai, não dura mais de um dia. 

Para observadores interessados em localizar essa estrela, um mapa da posição de T CorB pode ser visto abaixo:

Fig. 2 Mapa da posição de T CorB fornecido pela Associação Astronômica Britânica. Essa estrela tem mag. 10, mas está prevista uma erupção até a mag. 2.0 para o iníco de 2024 (provavelmente janeiro).

Essa estrela se localiza próximo a ε e δ Cor conforme mostrado no mapa. A grande questão no momento é saber quando será o novo máximo. Segundo Shears, um artigo recentemente publicado prediz o próximo máximo para o início de 2024 [2]. É um ponto da conclusão 5 desse artigo que:
Uma comparação da curva de luz AAVSO para o período 2005-2023 com o modelo da explosão de 1946 criado por Schaefer (2023) torna possível prever a data da próxima erupção do tipo nova clássica do T CrB - o início de 2024.
Portanto, que os observadores diligentes estejam atentos!

Referências

[1] Shears J (2023). Get set for the next eruption of the recurrent nova T Coronae Borealis! https://britastro.org/section_news_item/get-set-for-the-next-eruption-of-the-recurrent-nova-t-coronae-borealis 

[2] Maslennikova, N. A., Tatarnikov, A. M., Tatarnikova, A. A., Dodin, A. V., Shenavrin, V. I., Burlak, M. A., ... & Strakhov, I. A. (2023). Recurrent Symbiotic Nova T Coronae Borealis Before Outburst. arXiv preprint arXiv:2308.10011.

08 setembro 2023

Cometas em 2023: C/2023 P1 (Nishimura)

Cometa C/2023 P1 (Nishimura) observado desde a Áustria por Michael Jaeger em 3/9.
Esse interessante cometa foi descoberto de maneira espetacular pelo astrônomo amador japonês H. Nishimura no último 11 de agosto. Espetacular porque sua existência passou incólume por inúmeros sistemas de imageamento robotizados para ser descoberto por um humano dedicado. Parabéns ao seu descobridor!

Esse cometa tem condições peculiares de observação no hemisfério sul. Em primeiro lugar por causa de sua posição no céu, está praticamente junto ao sol, o que torna difícil sua observação em latitudes tropicais austrais antes de 12/9 (data de sua maior aproximação com a Terra). Esse cometa será melhor observado depois que tiver sua passagem periélica, o que ocorrerá após 17/9/2023 [1].

De fato, o site cometchasing [2] não dá como certo que esse cometa seja observável no hemisfério sul em setembro de 2023. Colocamos este post para orientação de nossos leitores, dadas as inúmeras notícias do norte sobre esse cometa na internet [3], sem a preocupação de saber se ele é um objeto apropriado para observação no hemisfério sul.

Com bastante dificuldades o cometa poderá ser visto desde Brasília/DF emergindo das "brumas do crespúsculo" como mostra a Fig. 2 abaixo, que é uma simulação do Stellarium para o dia 18/9 as 18:50. Nessa data, para Brasília, o cometa será um objeto muito baixo no horizonte ocidental, com magnitude próxima a 3.5. 

Fig. 2 Cometa Nishimura emergindo das brumas do crepúsculo no dia 18/9 por volta das 18:50 como visto desde Brasília/DF. Nessa data, o cometa será um objeto localizado a menos de 1 grau acima do horizonte oeste.

Em 21/9, o cometa já terá se elevado um pouco mais em relação ao horizonte e será observado junto ao planeta Marte, na constelação da Virgem. Em compensação, seu brilho se reduzirá para mag. 4.6. 

Os dias 20-22/9 parecem ser as datas para melhor observação desse cometa. Mesmo assim, ele não poderá ser observado a mais de 5° em relação ao horizonte, o que fará com que sua observação seja um desafio. Depois do dia 28/9, esse cometa desaparece por tempo indeterminado para os observadores na Terra.

Referências


[3] Descoberto há um mês, cometa Nishimura será visível neste fim de semana. https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/09/06/descoberto-ha-um-mes-cometa-nishimura-sera-visivel-neste-fim-de-semana.ghtml É uma notícia falaciosa sobre a observação desse cometa.

22 maio 2023

Cometas em 2023: C/2021 T4 (Lemmon)

 
Imagem do cometa Lemmon em 19/5/23 por G. Pappa. Fonte: www.aerith.net .

Sem dúvida, o cometa C/2021 T4 (Lemmon) é o objeto mais bem posicionado para observação no hemisfério sul e, em particular, no Brasil em 2023. Há outros cometas que poderão exceder seu brilho, como 62P/Tsuchinshan 1 ou o 103P/Hartley 2, porém, o periélio do cometa Lemmon coincide com o inverno no Brasil. Nesse época, o céu costuma não apresentar nuvens em uma extensa área na região sul-sudeste.

Como podemos ler aqui, o cometa Lemmon é um objeto do sistema solar de longo período, descoberto no observatório do Monte Lemmon em outubro de 2021. Seu periélio ocorre em 31/7/2023, porém, a data de máxima aproximação com a Terra é em 20/7/23. Em 22/7 sua posição  no interior do sistema solar pode ser apreciada na Fig. 1. 

Fig. 1 Posição do cometa C/2021 T4 no interior do sistema solar em 22/7/23.

Na data de máxima aproximação, estará localizada a aproximadamente 0.5 UA de distância da terra e em declinação -56 graus, favorecendo muito a observação no hemisfério sul. 

Também estará em elongação de144 graus, como mostrado na Fig. 1, praticamente em oposição. Estima-se que alcançe mag. 7.0-8.0, o que o faz um objeto excelente para observação por binóculos e telescópios em lugares escuros e sem a presença da lua. Em 17/7/23 há uma lua nova, o que indica condições ideais de observação nas semanas próximas à data de máxima aproximação.

Fig. 2 Posição do cometa C/2021 T4 em 20/7/2023.

No início de julho até o dia 18/7/2023 estará localizado na constelaçao do Grou (Grus) dirigindo-se "oficialmente" para o Telescopium.  Na data de máxima aproximação, estará localizado entre as constelações do Pavão e do Índio, próximo da estrela α Pavonis (Peacock). Desde Brasília, por exemplo, alcançará a elevação de 62 graus acima do horizonte sul, podendo ser observado após o por do sol. 

Será um objeto interessante que poderá ser fotografado com câmeras sem acompanhamento em modo de exposição com auxílio de um tripé para prover estabilidade. 

Referências

http://www.aerith.net/comet/catalog/2021T4/2021T4.html

http://astro.vanbuitenen.nl/comet/2021T4




06 março 2023

Recursos em astronomia para usar em casa II (Python + TESS)

Análise da curva de luz da variável eclipsante Algol por meio de dados do telescópio TESS. Fonte: catálogo SIMBAD.

Como continuação da série "Recursos em astronomia para usar em casa" vamos aqui descrever como trabalhar com dados astronômicos distribuídos em larga escala na internet por meio da linguagem de programação Python.

Leitores que não tenham conhecimento dessa linguagem podem usar como referência de aprendizado [1-2]. Os comandos apresentados aqui podem ser reproduzidos usando o recurso Jupyter Notebooks [3] de modo online.

Nossa ideia aqui é demonstrar a rapidez com que dados de qualidade podem ser acessados, mesmo de telescópios espaciais. No caso, usaremos dados da missão TESS (satélite de busca de exoplanetas em trânsito, Fig. 1) [2] lançada em 2018 e que é formada por diversos telescópios que escaneiam o céu nas proximidades da Lua para estudos em fotometria estelar e busca de exoplanetas.

Fig. 1 Órbitas da missão TESS de busca de exoplanetas. A órbita de serviço final é mostrada em azul. Fonte: Astronomy magazine.

Captura da curva de luz TESS de Beta Persei.

Sabe-se que β Persei, também chamada "Algol", é uma estreva variável. Sua variabilidade é extrínseca, isto é, causada pelo fato de ser uma estrela binária (na verdade, uma estrela tripla). Por meio do catálogo SIMBAD [4], podemos acessar diversas informações sobre essa estrela pela busca "basic search" do link fornecido usando como texto de busca "beta Per". Uma informação relevante para acessar sua curva de luz é seu número TIC (TESS Input Catalog) que, para Algol, é 346783960.

Esse número é importante, pois dá acesso aos dados disponíveis em uma série de catálogos online. Como vimos no post anterior, isso pode ser feito através do arquivo Barbara A. Mikulski [5]. Uma outra maneira é por meio da biblioteca Python lightcurve [6]. Como a descrição desse tutorial diz, esse recurso em Python possibilita
Uma maneira amigável de analisar dados de séries temporais sobre o brilho de planetas, estrelas e galáxias. O pacote está focado em apoiar a ciência com os telescópios espaciais Kepler e TESS da NASA. 
Para permitir seu uso, devemos instalar a biblioteca antes com o comando:
import lightkurve as lk
Nesse caso, lk é apenas um nome para o "instanciamento" de uma classe que permite acessar os dados externamente.  Para se plotar gráficos, convém também carregar a biblioteca matplotlib por meio do comando:
import matplotlib.pyplot as plt
Esses comandos são colocados no início do script Python e devem ser precedidos pela instalação das bibliotecas por meio do comando pip install:

pip install lightkurve

Uma vez que os dados de uma certa estrela podem ser capturados em mais de um campo ao longo do tempo (ou seja, um mesmo setor do céu é periodicamente revisto pelo TESS), é necessário saber qual o "setor" onde os dados podem ser acessados. Para fazer isso, o seguinte comando pode ser utilizado:
search_result = lk.search_lightcurve(TIC_numb, author='SPOC')
TESS_sectors=[sec for sec in search_result.mission]
kindex=0
print('Available sector(s) for ', TIC_numb, '::')
for sec in TESS_sectors:
print('[', kindex, '] =',sec)
kindex+=1
a função search_lightcurve(TIC_numb, author='SPOC') toma um TICnumb de entrada e retorna uma estrutura "search_result" contendo inúmeros dados referentes ao TIC passado. Dentre eles, os setores TESS por uma busca recorrente em "search_result.mission". Em março de 2023, o código acima para TIC_numb='346783960' retorna:

Available sector(s) for  TIC 346783960 ::
[ 0 ] = TESS Sector 18
[ 1 ] = TESS Sector 58

O setor mais recente é o 58. Esse número é usado como entrada para uma nova chamada da função search_lightcurve com adição do parâmetro 'sector' correspondente:
search_result = lk.search_lightcurve(TIC_numb, author='SPOC', sector=sector_numb)
light_curve=search_result.download()

Todos os dados capturados pelo telescópio espacial para Algol no setor indicado são gravados na estrutura light_curve. Essa não é uma variável, mas um conjunto grande de dados (como uma classe) que contém a curva de luz. A curva de luz pertinente pode ser imediatamente colocada em um gráfico usando a biblioteca matplotlib e o comando

light_curve.normalize().plot(linewidth=0, marker='.', color='blue')
plt.show()

que resulta na Fig. 2 abaixo. Note que a função plot() permite diversos parâmetros de entrada como "color" que especifica uma cor para a linha do gráfico. Da maneira como está progamado acima, o gráfico resultante é feito por meio de pontos em azul.

Fig. 2 Fluxo normalizado para Algol obtido pelo telescópio espacial TESS obtido pelos códigos em Python descritos aqui. Esses gráfico mostra os máximos e mínimos da variável eclipsante. No eixo x o tempo desde a época 2457000 BTJD (data Juliana Baricêntrica) é utilizado e o valor resultante é lido em dias. 

A partir da curva de luz é possível, por exemplo, determinar o período de variação de brilho que corresponde ao tempo que o par principal em Algol leva para revolucionar em sua órbita em torno de um centro de massa comum. 

Os mínimos mais profundos (principais) ocorrem quando a estrela mais brilhante é eclipsada pela mais fraca, enquanto que os mínimos menos profundos (secundários) ocorrem nos momentos de eclipse da estrela mais fraca pela mais brilhante. Por causa disso, a forma e distância entre os mínimos contêm informação sobre a temperatura das estrelas do par. 

Periodograma da curva de luz

O leitor pode mensurar o período calculando a diferença de tempo entre os mínimos principais. Entretanto, a biblioteca lightcurve possui funções específicas que disponibilizam análise mais específicas da dinâmica da curva de luz. Um desses recursos é a função que calcula o periodograma da curva. Um periodograma é um diagrama de períodos fundamentais encontrados em uma série temporal. Uma curva senoidal pura, por exemplo, terá um periodograma composto por apenas uma frequência. 

O periodograma pode ser obtido pela função to_periodogram() que é membra de light_curve usando o código abaixo. Esse código também especifica os comando para se plotar o diagrama de períodos como mostrado na Fig. 3. 
pg = light_curve.to_periodogram(oversample_factor=10)
pg.plot(title='Espectro de períodos de '+TIC_numb)
plt.xlim(0,5)
plt.show()
Fig. 3 Periodograma ou diagrama de períoidos da curva de Algol mostrada na Fig.2 obtida por meio da chamada da função to_periodogram()

No eixo y da Fig. 3 encontramos a potência em fluxo de eletrons/segundo, enquanto que no eixo x a frequência na unidade 1/dia. Ocorrem diversos picos, correspondentes à distribuição de potência da curva de luz. O pico mais alto está próximo do período principal de oscilação e é comensurável com o período orbital de revolução do par. 

O período para o máximo é facilmente determinado como o membro period_at_max_power da estrutura pg retornada pela aplicação da função  to_periodogram(). Para monstrar na linha de comando esse período de máximo basta fazer:
print('Periodo na máxima potência', pg.period_at_max_power)
que retorna o valor 1.43618 dias. O período de revolução corresponde ao dobro desse valor, ou 2.87 dias.

Diagramas de fase

Uma importante ferramenta de pesquisa são os diagramas de fase "dobrada". Por meio desse recurso, escolhe-se um momento da curva de luz e um valor P de período e projeta-se, em um mesmo gráfico, as repetições da curva a cada P escolhido. Se P corresponder ao valor de uma periodicidade maior do brilho, então as diversas curvas se alinham umas sobre as outras, revelando a precisão de um ajuste obtido.

Para obter o diagrama de fase, invoca-se a função fold() que é membra de light_curve. Essa função  permite admite alterar o período de dobra por meio do parâmetro "period" e um múltiplo de fase, wrap_phase. A série de comandos abaixo realizada a dobradura de fase e plota um gráfico de pontos (scatter) usando como período o retorno de perido_at_max_power corrigido por um valor (1-eps), onde eps = 0.002. Note que esse valor eps é ajustado na mão. O valor 0.002 foi o que melhor retornou curvas sobrepostas como mostrado na Fig. 4.  
eps=0.002
light_curve.fold(period=2.*(1-eps)*pg.period_at_max_power,
wrap_phase=2).scatter()
print('Melhor período encontrado =',\
                (2.*(1-eps)*pg.period_at_max_power))
plt.show()
Fig. 4 Diagrama de fase dobrada (phase folding) para a curva de luz da Fig. 2 e período ajustado a partir do retornado segundo o periodograma da Fig. 3.


O melhor período encontrado foi assim 2.8666162 dias. Notamos que o diagrama de fases dobradas se altera se não houver especificação do período até, pelo menos, 4 casas depois do ponto decimal. Asim,  concluímos que o período pode ser definido com grande precisão a partir da análise realizada usando dobradura de fase. Esse períodos em unidades de tempo da Terra é igual a 2 dias, 20 horas e 47 minutos.

Um outro exemplo: sistema sextuplo Sistema TYC 7037-89-1 ou TIC 168789840

Como Algol é uma binária muito conhecida, aplicamos aqui o método descrito acima com sistema TYC 7037-89-1 ou TIC 168789840. Trata-se de uma singela estrelinha de mag. visual 11.5 na constelação do Eridanus, classificada como "binária eclipsante" no SIMBAD, mas que foi recentemente confirmado como um sistema de estrelas sextuplas [7]. Para isso substituimos o TIC de entrada pelo valor 168789840 e buscamos por dados no setor 32. A curva de luz resultante é conforme a Fig. 5.

Fig. 5 Curva de luz TESS para o sistema TYC 7037-89-1 exibindo uma complexa sequência de mínimos. Esse sistema corresponde a um conjunto de 6 estrelas que formam um sistema  sextuplo eclipsante.

O mais impressionante foi a confirmação de que se trata de  um sistema sextuplo (o que é raro) e, ainda mais, todos os componentes se alinham em relação à Terra para produzir eclipses! A estrutura do periodograma é mostrada na Fig. 6.

Fig. 6. Periodograma obtida pelo método descrito aqui para o sistema sextuplo. A presença de inúmeros picos secundários em torno do principal revela a existência de outros componentes na estrutura dos eclipses. 

O diagrama de fase ajustado (para eps = 0.002) é mostrado na Fig. 7.

Fig. 7 Diagrama de fase dobrada para o período principal correspondente ao máximo do periodograma e corrigido para o fator eps = 0.002. 

A presença de mínimos que não coincidem na Fig. 7 revela a existência de outros pares emaranhados na estrutura de variação de brilho. Esses foram separados e identificados como produzidos por eclipses periódicos de 3 pares de estrelas. 

O período principal encontrado com o código acima foi 1.5691781 dias.

Referências

[1] Devmedia (2022). Python Tutorial. https://www.devmedia.com.br/python-tutorial/33274 

[2] UFF (2009) Tutorial de Introdução ao Python. https://www.telecom.uff.br/pet/petws/downloads/tutoriais/python/tut_python_2k100127.pdf 

[3] https://jupyter.org/try-jupyter/lab/

[4] http://simbad.cds.unistra.fr/simbad/ 

[5] https://mast.stsci.edu/portal/Mashup/Clients/Mast/Portal.html

[6] https://docs.lightkurve.org/

[7] C. Gebhardt (2021). TESS reveals triple-binary eclipsing star system & Sun-like star with extremely close exoplanets. Ver: https://www.nasaspaceflight.com/2021/01/tess-triple-binary-eclipsing-star-system-close-exoplanets/



https://docs.lightkurve.org/tutorials/1-getting-started/what-are-periodogram-objects.html 


17 janeiro 2023

Cometas em 2023: C/2022 E3 (ZTF)


Imagem do cometa C/2022 E3 (ZTF) 18/12/2022 por Michael Jager.

Trata-se de um cometa que tem recebido atenção exagerada de inúmeros sites nacionais. Muitos desses sites replicam sem contestação o que traduzem de outros sites externos empolgados por um cometa favorável ao hemisfério norte.

Até o momento, será o cometa mais brilhante em 2023 para o Brasil, muito embora seu brilho atinja mag. 4.5 em janeiro de 2023 em favor do hemisfério norte e se reduza para 5.0 em fevereiro. Isso torna o C/2022 E3 (ZTF) de difícil observação a não ser na zona rural. Definitivamente, não é um alvo para observação fácil para o grande público fixado nas grandes cidades. Além da posição boreal, a empolgação com sua chegada se deve a uma variação inesperada de brilho que o colocou no limite da observação visual. Aguardaríamos outra explosão de brilho?

Como é um cometa com órbita de excentricidade próxima a 1.0 (uma parábola) trata-se de um corpo que, provavelmente, não retornará ao sistema solar interior. É um membro da distante núvel de Oort. 

Em janeiro de 2023 atingiu o periélio no dia 12. Será um objeto de difícil observação no hemisfério sul em seu brilho máximo, exceto para localizações mais próximas do equador. É o caso para observadores na região norte do Brasil, principalmente nos Estados de Amapá e Roraima. No final de janeiro atinge sua posição mais boreal possível e mais próxima da terra (0,284 UA de distância), próximo à estrela Polaris da Ursa Menor (declinação +71 graus). 

Depois de sua máxima aproximação, segue em direção ao hemisfério austral, porém, quando estiver em posição favorável para observadores do hemisfério sul terá reduzido de brilho de forma significativa, tornando-se visível apenas por meio de instrumentos. 

Referências

https://cometchasing.skyhound.com/

http://www.aerith.net/comet/catalog/2022E3/2022E3.html



04 janeiro 2023

Recursos em astronomia para usar em casa (TESS)

 

Da mesma forma como nossa vida se influenciou pelas plataformas digitais e mídias socias da internet, a Astronomia é hoje uma "comunidade virtual", onde pouco importa possuir um instrumento para fazer contribuições relevantes, desde que se participe da comunidade certa. Muitas comunidades de pesquisa disponibilizaram um grande número de recursos de acesso a dados gerados por instrumentos profissionais. Esses recursos podem ser usados para se fazer descobertas. 

Assim, nasce a possibilidade do astrônomo amador fazer contribuições, mesmo sem a necessidade de qualquer equipamento, exceto um computador com acesso à internet. Um exemplo prático é o banco de dados MAST (Mikulski Archive for Space Telescopes, acessível via https://mast.stsci.edu) que reúne milhares de entradas de dados sobre corpos celestes obtidas por inúmeros telescópios, inclusive espaciais.

Dentre os telescópios espaciais está o TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite, informação disponível em https://tess.mit.edu/science/) ou satélite de buscas por planetas em trânsito. A missão espacial TESS é uma continuação da missão Kepler responsável pela descoberta de milhares de planetas alienígenas ou "exoplanetas". Esse é o nome dado a planetas que orbitam outras estrelas. Um dos objetivos do TESS é achar planetas pequenos (com diâmetro menor que 4 diâmetros da Terra) em torno de estrelas suficientemente brilhantes.

Figura 1 Como se descobrem planetas alienígenas. Uma redução de brilho é observada quando um planeta passa na frente do disco da estrela. Imagem segundo [1]. Para ter eficiência, é necessário dispor de um instrumento que monitore constantemente o brilho de amplos setores no céu. Esse é o caso da missão TESS.

A TESS usa o método dos "trânsitos". Quando um planeta passa na frente de uma estrela, ocorre uma queda de luz (Fig. 1). Essa redução de brilho é detectada pelo telescópio. Na missão TESS 4 câmeras de 10 cm de diâmetro vasculham o céu periodicamente e produzem registros de brilho ao longo de vários dias. A redução observada de brilho é diretamente proporcional ao diâmetro do planeta alienígena. Dessa forma, quanto maior o planeta em relação à estrela, maior a chance de ele ser descoberto. Por outro lado, para um determinado diâmetro de planeta, quanto menor a estrela que o abrigue, maior a chance também de descoberta.

Há possibilidade real de astrônomos amadores contribuírem na descoberta de novos planetas usando dados da TESS, pois todos os seus dados são públicos. Uma maneira de se começar a analisar esses dados é por meio do projeto "Planet Hunters TESS" [1], que é um projeto voltado para "cidadãos cientistas". Ali é possível aprender a analisar curvas de brilho, discutir possíveis casos de interesse ou aprender sobre curvas de estrelas variáveis. Nesse último caso, é grande a chance de se topar com uma estrela variável ou binária eclipsante. Há milhões de entradas disponíveis.

Ao longo de vários posts, vamos discutir aqui as perspectivas de uso desses dados. Neste primeiro, mostramos um pouco sobre como é possível usar o MAST para acessar dados do TESS. Com acesso à internet é possível imediatamente visualizar dados de curva de luz. Aqui apresento um procedimento geral para isso. 

Acesso e análise dos dados do MAST da estrela π Mensae.


Figura 2 Campo de busca da estrela TIC 261136679 para acesso aos dados do telescópio TESS.

Como vamos acessar dados do TESS, precisamos conhecer como é feita a catalogação das estrelas na base de dados desse telescópio. Toda estrela em seu catálogo é registrada como um número com a sigla TIC (que significa TESS Input Catalog ou “catálogo de entradas TESS”) na sua frente. Por exemplo, um planeta foi descoberto na estrela π Mensae [2]. A estrela que abriga o planeta recebeu a designação TIC 261136679, embora seu nome também possa ser achado como “π Mensae” (ou SAO 258421, HD 39091  etc). Ao se entrar no catálogo [1], simplesmente copiamos “TIC 261136679” para o campo “end enter target” no campo superior direito e clicamos “search” como mostra a Fig. 2. O resultado da busca é uma página parecida como a Fig. 3.

Figura 3 Resultado da busca. A imagem da estrela é vista na parte direita.

Como mostrado nessa figura, restringimos o acesso para apenas dados TESS clicando-se na caixa disponível sob o título “Mission” na parte esquerda da tela. A imagem da estrela é mostrada na parte direita. Esse mapa é, de fato, uma foto que pode ser ampliada. Na parte central podemos ver vários segmentos de dados correspondentes às campanhas de observação realizadas em que dados do campo contendo a estrela procurada podem ser encontrados. Sob o título de coluna “Actions”, podemos clicar no botão com o símbolo:
que dá acesso a uma provável curva de luz já disponibilizada. Ao se seguir esse caminho, conforme a rapidez de sua conexão, aparecerá uma janela como mostrada na Fig. 4.

Figura 4 Visualizador de curva de luz.

Há duas opções de dados como mostrado na parte direita. O bloco em laranja (PDCSAP) corresponde aos dados processados. O bloco em verde/azul (SAP) são dados não processados. Deve-se escolher os dados processados. É possível alterar alguns parâmetros do gráfico da curva de luz central usando as opções que aparecem na parte esquerda. Para a série temporal (curva de luz) processada, o gráfico correspondente ao conjunto de número 14 é mostrado na Fig. 5. 

Figura 5 Dados processados do TESS para um dos setores em que a estrela π Mensae pode ser encontrada. As quedas de luz são produzidas por eventos de trânsito de um exoplaneta [2].

Esse gráfico mostra a variação de brilho (medido em fluxo de número de partículas por segundo) ao longo do tempo medido em dia. Há diversas quedas de luz observadas em intervalos regulares. O faixa central sem dados corresponde ao período de tempo em que o telescópio TESS estava transmitindo dados à Terra e, por isso, não foram tomadas medidas nesse intervalo. O tempo é medido em BJD (datas Julianas-Besselianas) diretamente relacionados a intervalos de tempo em horas e dias terrestres. 

As quedas observadas de luz na Fig. 5 são eventos de trânsito do exoplaneta. As variações na grande massa de dados entre os fluxos 1.46418 e 1.46504 são oscilações naturais no brilho da estrela ou resultado de incertezas no sensor. Essas oscilações determinam o limite de sensibilidade do telescópio TESS, pois, se as quedas observadas na Fig. 5 estivesse todas dentro desse intervalo, o planeta não teria sido observado. 

O intervalo de tempo entre as quedas é o período de trânsito do planeta que corresponde ao seu período orbital. O gráfico no MAST (Fig. 5) é interativo. Podemos medir o período simplesmente calculando a diferença nos tempos (eixo x) entre dois trânsitos sucessivos. Por exemplo, há uma queda mais ou menos em BJD 12,748 e outra imediatamente anterior em BJD 6,482. A diferença corresponde ao período de 6,26 dias. Para testar a validade desse tempo, abrimos a opção “phase folding” que realiza uma “dobradura de fase” na curva de luz de forma a empilhar dados no tempo conforme um período de tempo fornecido. Para isso, clicamos na opção “Phase folding” na parte esquerda do gráfico da Fig. 4, inserimos o valor 6,26 no campo “Period (days)” e clicamos em “enable phase folding”. O resultado é mostrado na Fig. 6. As quedas estão todas “encavaladas” em um mesmo intervalo de fase que se inicia em zero. Dessa forma confirmamos a descoberta de um planeta alienígena! Como no caso de TIC 261136679, existem milhares de outras estrelas que aguardam a contribuição de pessoas para identificar essas quedas de brilho nos gráficos. Esse é o objetivo do programa [1].

Figura 6 Resultado da operação de “dobradura de fase” com inserção do período de trânsito observado. 

A estrela π Mensae (mag. Visual 5,67) é classificada como uma estrela do tipo G0V que dista 18,2 parsecs da Terra, ou quase 60 anos-luz. Ela tem massa muito próxima a do Sol, assim como um raio parecido com ele. Portanto, se estivéssemos no sistema de π Mensae, nosso sol teria brilho aparente apenas um pouco inferior.

De fato, o sistema de π Mensae abriga pelo menos dois planetas, chamados b e c respectivamente. O período de c é 6,26 dias (segundo [2], 6,2679±0,00046 dias), enquanto que b tem período muito maior, da ordem de 2093 dias. O planeta c dista 10,2 milhões de quilômetros da estrela e tem uma massa igual a 4,82 massas da Terra [2], ou seja, é uma “superterra”. Para se ter uma ideia, Mercúrio dista em média 62 milhões de quilômetros do Sol. Por estar muito próxima da estrela, a superterra π Mensae c é um verdadeiro inferno. Um terceiro planeta “d” foi anunciado [3], mas permanece não confirmado.

Outros planetas confirmados são:
  • TIC 298663873 [4]: com período de 260 dias, ele somente teve um trânsito pelo TESS. Sua descoberta, feita por cientistas cidadãos, permitiu o monitoramento do trânsito quase que imediatamente. O período foi determinado por meio de medidas de velocidade radia.
  • TIC 307210830 [5]: aqui TESS revelou um sistema triplo, onde os componentes internos são rochosos e têm massas semelhantes à da Terra.
De uma lista com mais 280 entradas somente obtidas com dados do TESS. O leitor consegue encontrar no MAST as curvas de luz para os exemplos acima?

Conclusão

O exemplo aqui apresentado mostra que há mais chances de se descobrir algo novo e relevante nesses dados do que por meio de telescópios que o astrônomo amador tenha em sua casa, não importa o quão caro e equipado ele seja. Por outro lado, quem tem equipamentos sofisticados e munidos de fotosensores pode se envolver em campanhas de confirmação de variação de brilho de muitos alvos do TESS como, por exemplo, o caso TIC 298663873 que é um exoplaneta de longo período. 

Foi-se a época em que a Astronomia dependia crucialmente de instrumentos de amadores. Hoje, ela pode se beneficiar das pessoas, porém, muito mais por meio do acesso, análise e manipulação de um volume enorme de dados públicos obtidos por instrumentos profissionais e missões espaciais. Esses dados estão catalogados e calibrados, uma condição imprescindível para que tenham valor científico.

Entretanto, para que seja possível fazer descobertas, é preciso conhecimento no acesso, análise e interpretação dos dados. Nesse sentido, vamos apresentar como isso pode ser conseguido em uma série de posts futuros. 

Referências


[2] Huang, C. X., Burt, J., Vanderburg, A., Günther, M. N., Shporer, A., Dittmann, J. A., ... & Rinehart, S. A. (2018). TESS discovery of a transiting super-Earth in the pi Mensae System. The Astrophysical Journal Letters, 868(2), L39.


[4] Dalba, P. A., Kane, S. R., Dragomir, D., Villanueva, S., Collins, K. A., Jacobs, T. L., ... & Villaseñor, J. N. (2022). The TESS-Keck Survey. VIII. Confirmation of a Transiting Giant Planet on an Eccentric 261 Day Orbit with the Automated Planet Finder Telescope. The Astronomical Journal, 163(2), 61.

[5] Cloutier, R., Astudillo-Defru, N., Bonfils, X., Jenkins, J. S., Berdiñas, Z., Ricker, G., ... & Villasenor, J. (2019). Characterization of the L 98-59 multi-planetary system with HARPS-Mass characterization of a hot super-Earth, a sub-Neptune, and a mass upper limit on the third planet. Astronomy & Astrophysics, 629, A111.