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Ocultações como método de medida celeste.

Registro de uma ocultação de Saturno pela Lua em 2 de março de 2007 por Dave Smith (fonte: http://astrosnaps.co.uk/). O tempo de ocultação do disco do objeto pode ser usado para se determinar o diâmetro aparente e "real" conhecendo-se sua distância.  
Ocultações lunares sempre foram ocasiões importantes de medida em astronomia. Isso porque a velocidade da lua no céu é conhecida e, a partir dessa velocidade, é possível usar a lua como uma espécie de "paquímetro cósmico" e medir tamanhos de objetos ocultados. O objetivo esse post é mostrar de forma aproximada como isso pode ser feito. Para isso usamos de geometria, uma disciplina muito antiga, irmã da matemática. 

Qual é a ordem de grandeza desse "paquímetro cósmico"? O tempo de revolução lunar (período de revolução da lua) em torno da Terra deve descontar o movimento do par "Terra-Lua" em torno do próprio sol. Portanto, para se ter um valor mais correto para a velocidade angular da lua, devemos determinar essa velocidade em relação ao fundo do céu e usar o chamado "mês lunar sideral", que é de aproximadamente 27.322 dias e não o mês sinódico (1). Uma vez que uma dada posição no terminador lunar varre 360 graus, então a velocidade angular aparente média da lua (vL, ver Fig. 1) em torno da Terra é

vL=360*60*60/(27.322*24*60*60)=360/(27.322*24)=0.549"/s (segundos de arco por segundo)

que é igual a 0.549 graus por hora ou minutos de arco por minuto. Portanto, em um minuto (=60 s), a lua cobre aproximadamente 32.94 segundos de arco no céu.  Isso significa que, se tivermos como medir com precisão o tempo, podemos usar o período da ocultação, que chamamos aqui Δt (início da imersão no limbo até desaparecimento completo), como uma medida de extensão. Com o conhecimento da distância do objeto, é possível saber seu tamanho. Do contrário, conhecendo sua dimensão, pelo tempo de ocultação determinamos sua distância. 

Por exemplo: Sabemos que o diâmetro equatorial de Júpiter (Dia_jupiter) é da ordem de 139 820 km. Ele foi ocultado pela lua, e o tempo Δt de desaparecimento do disco de Júpiter foi de 1 minuto e 7 segundos ou ~67 segundos. Qual a distância de Júpiter da Terra?

No cálculo da resposta, desprezamos o movimento de translação da Terra, o movimento próprio de Júpiter durante seu desaparecimento, assim como diferenças de posição geométrica (parte do terminador lunar onde ocorreu a ocultação) e admitimos que ela se deu ao longo do "equador" lunar. Uma regra de três simples, permite obter sua distância D,

(Dia_jupiter)/D= (67s/60s)*32.94"=36,783"=1.78328E-4 rad.

O resultado final deve ser escrito em radianos para se obter uma relação direta com a proporção de distâncias (Fig. 1). Invertendo-se a equação encontramos D = 139820km/1.78328E-4=7.84E8 km ou aproximadamente 784 milhões de quilômetros. Veja o papel importante da velocidade vL na equação acima. Ela é a constante que resulta no diâmetro aparente de Júpiter (36.78") para se obter a razão das distâncias em radianos.  Esse diâmetro também poderia ser obtido por um micrômetro filar mas, mais recentemente,  o registro de imagens tornou a astronometria uma ciência mais precisa.
Geometria do fenômeno da 
ocultação lunar.

Aplicação às estrelas.

Sem dúvida, o método da ocultação lunar permite determinar diâmetros ou distâncias. O mais natural é que sirva, no sistema solar, para se inferir o diâmetro de objetos já que suas distâncias são calculadas a partir da dinâmica de movimento (3a lei de Kepler). Mas, poderiam as ocultações serem usadas para se medir estrelas?

Para saber isso, basta calcular o tempo de ocultação de uma estrela, digamos, a 10 anos-luz de distância da Terra (que está praticamente na vizinhança do Sol) admitindo novamente que se trata de uma ocultação no "equador lunar" (ou seja, não é "rasante"). Esse tempo de ocultação deve ser comparado ao período de amostragem do medidor - no caso, representamos como o tempo de tomada de cada pose, ou tempo de exposição da uma câmera. Esse cálculo é importante porque vai mostrar que não basta ter um método, é preciso haver resolução suficiente para sua medida.

Imaginemos uma estrela com o diâmetro igual ao do Sol, ou dia_sol = 1 394 000 km. Agora, 1 ano-luz é igual a 9.461E12 km. Portanto, o diâmetro aparente da estrela será de

dia_sol/D = 1394000km/9.461E13km = 1.4734E-8 rad. 

Ora, o ângulo resultante da razão entre as distâncias corresponde a um diâmetro aparente de 5.3E-5". Para saber o tempo de ocultação do disco da estrela, dividimos pela velocidade aparente da lua:

Δt=5.3E-5"/0.549"/s ~ 1.E-4 s

que é aproximadamente igual a 1/10000 segundos! (um valor mais preciso é 9.66E-5 s). Para se determinar o tempo de ocultação com razoável precisão, uma câmera com resolução temporal dez vezes maior é recomendada. Portanto, para se medir tal diâmetro de estrela, uma câmera com 100 mil quadros por segundo seria necessária. Existem câmeras especialmente desenhadas e construídas - para fins de pesquisa - com essa "frame rate" ou até mais (2), porém, nenhuma câmera comercial está disponível com tal característica. 

Portanto, nenhum amador, munido das melhores câmeras existentes, conseguirá presentemente medir o diâmetro de uma estrela próxima com base no método da ocultação. Ainda que a estrela estivesse 10 vezes mais próxima (a 1 ano-luz, por exemplo) ou fosse 10 x maior que o Sol, ainda assim seria impossível resolver seu diâmetro por esse método.  E a situação é ainda pior para a imensa maioria das estrelas que estão a centenas de milhares de anos-luz de distância da Terra...

Referências



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