02 dezembro 2018

Almanaque astronômico brasileiro 2019

Capa do ALMA 2019 com homenagem ao eclipse de Sobral de 1919.

O "Almanaque Astronômico Brasileiro 2019" (ALMA 2019), produzido pela CEAMIG (Centro de Estudos Astronômicos de Minas Gerais) já está disponível para download.  Organizado por Antônio Rosa Campos, essa obra pode ser baixada GRATUITAMENTE no link:


Da "apresentação" (item III) da obra, reproduzimos o parágrafo:
Chega-se então ao marco de 16 anos de edições contínuas, quando em 2003 foi lançada a sua primeira edição, trazendo sempre como escopo a disseminação da Ciência Astronômica em seu aspecto simples. Assim, continuam inseridos os fenômenos que ocorrerão na abóbada celeste, sendo que neste ano foram introduzidas algumas sugestões por parte dos integrantes da Turma Apus (3ª turma do GREC - Grupo de Reconhecimento e Estudos do Céu) que conta com associados recém-ingressos no CEAMIG e que buscam elevar seus conhecimentos sobre a esfera celeste.  
De fato, com 197 páginas, há bastante material para consulta, principalmente na forma de tabelas numéricas, reproduzindo a maneira clássica com que almanaques astronômicos apresentavam informação de natureza astronômica. A maior vantagem do ALMA 2019 é ser uma obra voltada para o território brasileiro. Por exemplo, na Figura abaixo, um mapa da Lua (p. 103) apresenta as circunstâncas da ocultação de Vênus pela lua que ocorrerá em 31 de janeiro de 2019, relacionando as diversas cidades no Brasil em que o fenômeno poderá ser visto de dia. 

Circunstâncias da ocultação de Vênus pela Lua em 31/1/19 conforme ilustrado no ALMA 2019.

Além de muita informação sobre ocultações para o território nacional, eclipses e chuveiros de estrelas, há também uma seção dedicada a cometas em 2019. Um dos cometas mais brilhantes de 2019, ficamos sabendo pelo Almanaque, será o P/2008 Y12 (SOHO), ver p. 186, que atingirá mag. -1,9 em 9 de outubro de 2019, quando, porém, estará em conjunção com o Sol. Efemérides para os principais cometas previsíveis de 2019 são fornecidas em intervalos de dois dias. 

Certamente, o ALMA 2019 é uma importante obra de informação astronômica para o Brasil, razão porque parabenizamos seus organizadores a fim de que possam continuar a manter o excelente trabalho.


07 novembro 2018

Cometas em 2018: 38P/Stephan-Oterma


Imagem do 38P/Stephan-Oterma por Roland Fichtl de 10 de setembro de 2018.
O objeto 38P/Stephan-Oterma é um cometa periódico (dai a designação "P"), que se aproxima do interior do sistema solar a cada 38 anos. Descoberto por J. E. Coggia em 1867.Esse astrônomo confundiu o cometa com uma nebulosa e coube a E. J. M Stephan notar que a pequena mancha observada era, de fato um cometa. Esse astro permaneceu perdido até que o astrônomo Finlandês L. Oterma o redescrobrisse em 1942. Dai o seu nome.

Considerado um "cometa obscuro" [1], sua visita em 2018 será favorável em proximidade e o posição em relação à Terra, com máximo de brilho (mag. 6.7) no final de novembro de 2018. Isso porque, segundo [1], essa será uma das melhores aproximações desse cometa no século 21.  Chegará a distância de 0.77 UA da Terra em 15 de dezembro de 2018, mas seu maior brilho se dará em novembro (seu periélio é em 10 de novembro). Sua próxima melhor aproximação será de 0.7 UA em novembro de 2056. Um diagrama orbital do cometa pode ser visto na figura abaixo.

Diagrama orbital visto em [3] reproduzido em 7 de novembro que mostra o cometa na órbita lilás. A Terra está representada em azul.
Sua proximidade em 2018 se dará na região do céu entre Gêmeos e Câncer, o que favorece observadores no hemisfério norte. A figura abaixo reproduz o mapa disponível em PDF no site Comet Chasing

Mapa celeste da posição do cometa 38P/Stephan-Oterma obtido em [4].

O que facilita a observação desse cometa é sua posição no céu e a geometria de sua órbita que permitirá sua observação sem a proximidade do sol e durante a noite toda. Para observá-lo, é melhor usar um binóculo, embora telescópios também podem ser usados. A lua (cheia em 23/11) prejudicará sua observação, razão porque é melhor tentar avistá-lo até por volta do dia 20/11 desde um local sem poluição luminosa.
Referências

[1] https://www.universetoday.com/140043/2018-prospects-for-obscure-comet-38p-stephan-oterma/


02 setembro 2018

Cometas em 2018: 46P/Wirtanen (o grande cometa de 2018)

Imagem do cometa Wirtanen tirada em 1997 por T. Credner, K. Jockers, T. Bonev no observatório Pik Terskol, no Cáucaso.
Sem qualquer dúvida, o 46P "Wirtanen" será o grande cometa de 2018. Por causa da geometria de posição de sua órbita em relação à Terra, ele é um dos dez cometas que mais terão se aproximado da Terra nos últimos séculos. Será melhor observado a partir da terceira semana de novembro de 2018.

O que faz um grande cometa do ponto de vista do observador na Terra? Certamente seu tamanho, entretanto, a posição em relação à Terra, ponto de máxima aproximação e ângulo de fase com o sol são fatores muito relevantes. Tais condições serão obedecidas pelo 46/P Wirtanen. O cometa 46P foi descoberto em 1948 por Carl Wirtanen no observatório de Lick nos Estados Unidos. Diversas passagens afélicas (pontos mais afastado do sol) foram marcadas por grande proximidade com o planeta Júpiter, o que perturbou seu período orbital. Ao longo do tempo, seu esse período diminui e, atualmente, é da ordem de 5,5 anos. Com isso, sua atividade interna aumenta, o que causa também aumento de brilho.

Uma "quase colisão" com a Terra

A passagem de 2018 será excepcional, pois o cometa chegará a incrível distância de 0,077 UA da Terra. Do ponto de vista interplanetário isso é quase que uma colisão. Ainda assim, a medida equivale a 30 vezes a distância Terra-Lua, ou aproximadamente, 11,5 milhões de quilômetros! Tal fato coloca o cometa Wirtanen como um dos dez cometas que mais terão se aproximado da Terra nos últimos tempos (ver Ref. 2). 

Vantagens da passagem de 2018: porque observar o 46/P Wirtanen

De acordo com a Ref. 1 são várias as vantagens da passagem do 46P em dezembro de 2018:
  • Favorecimento pelo fato do cometa Wirtanen ser inerentemente brilhante;
  • A magnitude (brilho) do cometa poderá alcançar a vista desarmada e o astro poderá ser bem apreciado por instrumentos;
  • Será visto por várias horas durante meses antes e depois da máxima aproximação, por ambos os hemisférios;
  • Ao se usar um instrumento com resolução espacial de 1 segundo de arco para observação de detalhes do cometa (por exemplo, um telescópio com 120 mm de abertura), o observador terá resolução real da ordem de 57 km (o que é bem pequeno para o nível de detalhamento comum da maioria das aproximações de cometas);
  • Será possível registrar fotograficamente a região interior da coma (cabeleira do cometa);
Do ponto de vista científico, será possível, a partir da Terra, monitorar o comportamento do brilho e espectro do cometa e sua correlação com atividade solar durante vários meses. Como o cometa tem pequeno período, ele poderá ser alvo de uma futura missão espacial a partir desses estudos.

De fato, o 46/P Wirtanen já foi selecionado para ser um alvo da sonda Rosetta.

Condições da passagem e facilidade de observação

No momento de maior aproximação do cometa, ele estará na constelação do Touro, uma região razoavelmente conhecida e com inúmeros objetos celestes famosos.  A geometria orbital é mostrada na figura abaixo. Esse diagrama representa a órbita do cometa em vermelho e a posição dos planetas interiores no dia 17/12/2018, data da máximam aproximação da Terra. Na animação de onde se extraiu essa imagem, os planetas e o cometa giram 'na mesma direção', o que faz com que o este seja 'seguido' pela Terra durante muito tempo, tanto antes como depois do periélio. Isso explica porque esse será um cometa observado durante vários meses.

Geometria da órbita do cometa 46P Wirtanen  os planetas do sistema solar interior no dia 17/12/2017 (data da máxima aproximação). 
O periélio desse cometa ocorrerá em 13/12/2018 (Ref. 3), entretanto, na data de sua maior aproximação (17/12/2018),  ele estará no céu nas coordenadas AR 04h04' e DEC +23°54', muito próximo do aglomerado das Plêiades, movendo-se rapidamente contra o fundo das estrelas.

Mapa Stellarium da posição do cometa 46P/Wirtanen em 17/12/2018 - maior aproximadação da Terra - por volta das 20:00 do tempo legal de Brasília. O aglomerado das Pleiades pode ser visto nesta simulação e o cometa está próximo das estrelas 44 e Phi Tau (Alkalbain).
Quanto à magnitude desse objeto, algumas estimativas (ver Ref. de Seiichi Yoshida, 4)  preveem que ele alcançará mag. 3.0, ou seja, visível à vista desarmada. Provavelmente, sua magnitude estarará entre 3.0 e 5.0.  O diâmetro aparente da coma (cabeleira) estimado na data será de aproximadamente 10' de arco ou 1/3 do diâmetro da lua.

No período de máxima aproximação o 46/P Wirtanen variará muito rapidamente de posição no céu. Por meio de um telescópio será possíve apreciar sua mudança de posição contra o fundo das estrelas.

Depois da máxima aproximação, ele será um objeto mais facilmente visto desde o hemisfério norte. Dessa forma, os meses que antecedem dezembro de 2018 favorecem observadores do hemisfério sul (ver abaixo).

Posteriormente publicaremos mapas detalhados de sua posição a partir do final de novembro de 2018.

Observação no Brasil

A semana de 4-17 de dezembro de 2018 não terá influência marcante da lua, o que facilita a observação de objetos como cometas. O problema maior no Brasil (principalmente na parte sul) é a influência das nuvens ou céu encoberto, já que dezembro é período chuvoso. Isso faz com que a região Nordeste seja a mais propícia para observação desse cometa no período de máxima aproximação. Qualquer abertura de nuvens deverá ser assim aproveitada para observar esse cometa.

Por  volta do final de novembro de 2018, desde o Brasil, ele será um objeto consideravelmente alto no céu, praticamente observado a noite toda, e visto entre as constelações da Fornalha e Escultor. A companha observacional do cometa parece se iniciar logo em setembro, extendendo-se até o final do ano, quando o cometa Wirtanen fica mais baixo no horizonte norte. Com alguma sorte, a observação do 46/P Wirtanen será facilitada pela ocorrência de um "outburst" ou aumento súbito de brilho, o que poderá tornar esse cometa ainda mais brilhante. É impossível prever a ocorrência desses fenômenos, o que depende da estrutura interna, composição e distância periélica do cometa.

Condição de observação do 46P/Wirtanen antes do periéldio, segundo a Ref. 5. para latitude 20° Sul. Ver texto abaixo para explicação de cada curva.
A figura acima ilustra a condição de observação antes do periélio para o cometa 46/P Wirtanen em latitudes da ordem de 20° ao sul do equador (o que corresponde aproximadamente à latitude da região sul-sudeste do Brasil).

A curva em preto corresponde ao eixo vertical da esquerda onde se lê o tempo em que o cometa estará acima da elevação de 30° em relação ao horizonte. O tempo de observação para elevações acima de 15° é fornecido pela curva em azul.

A curva em vermelho é uma estimativa para a magnitude total do cometa, enquanto que a curva em laranja para a magnitude do núcleo, ambos os valores lidos no eixo vertical à direita. Essa estimativa está de acordo com uma fórmula fornecida pelo JPL e pode não corresponder ao que será observado de fato (ou seja, a cometa poderá ser mais brilhante). A Ref. 4 deverá ser consultada sobre atualizações. O periélio é marcado pela linha vertical em azul.

Como se pode ver, dezembro é o mês de máximo brilho, mas o cometa tem sua presença no céu reduzida drasticamente à medida que o final do ano se aproxima. Em 2019, o 46/P Wirtanen só se torna visível na mesma latitude (hemisfério sul) em meados de maio e, mesmo assim, sua magnitude estimada será ~16.0, acessível visualmente, portanto, apenas por grandes instrumentos ou por registro fotográfico.

A campanha de estudo da morfologia da coma do cometa 

A coma de um cometa é uma região que circunda o núcleo (o nome deriva do grego para "Cabeleira") e dá aos cometas quando distantes o aspecto de globos de luz. Por causa da oportunidade única de grande aproximação, o Instituto de Ciência Planetária (PSI, Ref. 5) lançou uma campanha para o envio de imagens fotográficas de qualidade que permitam o registro de detalhes da coma do 46/P Wirtanen. Uma campanha parecida foi realizada com o defunto cometa ISON.

O leitor deve atentar para o fato de que, não obstante a "proximidade" do cometa, uma resolução da ordem de 1" de arco corresponde a quase 60 km de resolução real. Instumentos amadores conseguem, talvez, reduzir esse número para a metade. O núcleo do Wirtanen é estimado em 600 m de diâmetro (não é esférico, mas parece uma "batata"), de forma que será impossível para qualquer instrumento na Terra resolver (observar) apenas o núcleo. Assim, a partir do aspecto da coma, cientistas esperam  estimar qualquer mudança de orientação do núcleo, o que é importante para compreender sua dinâmica.

Para isso, uma rede de observadores ao redor do mundo será necessária. Essa rede - nos dois hemisférios - cumpre o papel de resolver temporalmente a necessidade de observação, preenchendo eventuais lacunas com o mau posicionamento do cometa desde apenas um lugar e também possibilitando o registro em condições atmosféricas ideais.

Astrônomos amadores que enviarem imagens de alta definição da coma do cometa Wirtanen participaração como co-autores de trabalhos científicos que serão publicados após a realização de vários estudos pelo PSI. Os detalhes quanto ao tipo de imagem a ser enviada (tamanho, pré-processamento, resolução etc) estão todos na Ref. 5.

Referências

As referências abaixo contém outras informação sobre a passagem do cometa Wirtanen.

1 -  Comet 46P/Wirtanen - 2018 Apparition (a página mais completa da rede com informações desse cometa)